Texto
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No
fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de
nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve
um momento em que o silêncio foi tão grande escutando
o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu
uma criança feia. Essa criança é que chamaram
de Macunaíma.
Já
na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais
de seis anos não falando. Si o incitavam a falar exclamava:
Ai
Ai! que preguiça!...
e
não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, trepado
no jirau da paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente
os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê
na força de homem. O divertimento dele era decepar cabeça
de saúva. Vivia deitado mas si punha os olhos em dinheiro,
Macunaíma dandava pra ganhar vintém.
Mário
de Andrade. Macunaíma. Rio de
Janeiro, Livros Técnicos e Científicos; São
Paulo,
Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia, 1978, p.7.