Os leigos sempre se medicaram por conta própria, já
que de médico e louco todos temos um pouco, mas esse problema
jamais adquiriu contornos tão preocupantes no Brasil como
atualmente. Qualquer farmácia conta hoje com um arsenal
de armas de guerra para combater doenças de fazer inveja
à própria indústria de material bélico
nacional. Cerca de 40% das vendas realizadas pelas farmácias
nas metrópoles brasileiras destinam-se a pessoas que se
automedicam. A indústria farmacêutica de menor porte
e importância retira 80% de seu faturamento da venda "livre'"
de seus produtos – isto é, das vendas realizadas
sem receita médica.
Diante desse quadro, o médico tem o dever de alertar a
população para os perigos ocultos em cada remédio,
sem que, necessariamente, faça junto com essas advertências
uma sugestão para que os entusiastas da automedicação
passem a gastar mais em consultas médicas. Acredito que
a maioria das pessoas se automedica por sugestão de amigos,
leitura, fascinação pelo mundo maravilhoso das drogas
"novas" ou simplesmente para tentar manter a juventude.
Qualquer que seja a causa, os resultados podem ser danosos.
É
comum, por exemplo, que um simples resfriado ou uma gripe banal
leve um brasileiro a ingerir doses insuficientes ou inadequadas
de antibióticos fortíssimos, reservados para infecções
graves e com indicação precisa. Quem age assim está
ensinando bactérias a se tornarem resistentes a antibióticos.
Um dia, quando realmente precisar do remédio, este não
funcionará. E quem não conhece aquele tipo de gripado
que chega a uma farmácia e pede ao rapaz do balcão
que lhe aplique uma "bomba" na veia, para cortar a gripe
pela raiz? Com isso, poderá receber na corrente sanguínea
soluções de glicose, cálcio, vitamina C,
produtos aromáticos - tudo isso sem saber dos riscos que
corre pela entrada súbita destes produtos na sua circulação.
MEDEIROS,
Geraldo. Veja. 18 dez. 1985