Tenho que interromper para dizer que "X" é o
que existe dentro de mim. "X" - eu me banho neste isto.
É impronunciável. Tudo que não sei está
em "X". A morte? a morte é "X". Mas
muita vida também, pois a vida é impronunciável.
"X" que estremece em mim e tenho medo de seu diapasão:
vibra como uma corda de violoncelo, corda tensa que quando é
tangida emite eletricidade pura, sem melodia. O instante é
impronunciável. Uma sensibilidade outra é que se
apercebe de "X".
Espero que você viva "X" para experimentar a espécie
de sono criador que se espreguiça através das veias.
"X" não é bom nem ruim. Sempre independe.
Mas só acontece para o que tem corpo. Embora imaterial,
precisa do corpo nosso e do corpo da coisa. Há objetos
que são esse mistério total do "X". Como
o que vibra mudo. Os instantes são estilhaços de
"x" espocando sem parar. O excesso de mim chega a doer.
E
quando estou excessiva tenho que dar de mim. Como o leite que
se não fluir rebenta o seio. Livro-me da pressão
e volto ao tamanho natural. A elasticidade exata. Elasticidade
de uma pantera macia.
Fragmento de Água-Viva,
Clarice Lispector
Sócrates: (Falando a Mênon)
— Examina, agora, o que em seguida a estas dúvidas
ele irá descobrir, procurando comigo. Só lhe farei
perguntas; não lhe ensinarei nada! Observa bem se o que
faço é ensinar e transmitir conhecimentos, ou apenas
perguntar-lhe o que sabe. (E, ao escravo):
— Responde-me: não é esta a figura de nosso
quadrado cuja área mede quatro pés quadrados? Escravo: — É. Sócrates: — A este quadrado não poderemos
acrescentar este outro, igual? Escravo: — Podemos. Sócrates: — Que múltiplo do primeiro
quadrado é a grande figura inteira? Escravo: — O quádruplo. Sócrates: — E devíamos obter o dobro,
recordaste? Escravo: - Sim. Sócrates: — E esta linha traçada
de um vértice a outro da cada um dos quadrados interiores
não divide ao meio a área de cada um deles? Escravo: — Divide. Sócrates: — E não temos assim quatro
linhas que constituem uma figura interior? Escravo: — Exatamente! Sócrates: — Repara, agora: qual é
a área desta figura? Escravo: — Não sei. Sócrates: — Vê: dissemos que cada
linha nestes quatro quadrados dividia cada um pela metade, não
dissemos? Escravo: — Sim, dissemos. Sócrates: — Bem; então quantas metades
temos aqui? Escravo: — Quatro. Sócrates: — E aqui? Escravo: — Duas. Sócrates: — E em que relação
aquelas quatro estão para estas duas? Escravo: — O dobro. Sócrates: — Logo, quantos pés quadrados
mede esta superfície? Escravo: — Oito. Sócrates: — E qual é seu lado? Escravo: — Esta linha. Sócrates: — A linha traçada no quadrado
de quatro pés quadrados, de um vértice a outro? Escravo: — Sim. Sócrates: — Os sofistas dão a esta
linha o nome de diagonal e, por isso, usando esse nome, podemos
dizer que a diagonal é o lado de um quadrado de área
dupla, exatamente como tu, ó escravo de Mênon, o
afirmaste.
Escravo: — Exatamente, Sócrates!
Fragmento
de Diálogos de Platão, Mênon
Imagine
que os trechos acima são “apresentados” diante de você,
como num teatro. O que você percebe a partir da leitura deles?