Unidade 3 Módulo 5
Tela 1
Módulo 05 - Programa de Qualidade Total
1 - Objetivos gerais

Para Edward Deming, os Programas de Qualidade Total (PQT) representariam uma revolução na administração, com o objetivo de tornar a economia norte-americana:

• mais competitiva,
• mais produtiva, e
• mais lucrativa.

Para alcançar objetivos audaciosos, seriam necessárias mudanças radicais na organização do processo produtivo, tais como:

• eliminar o desperdício, fator considerado responsável pela elevação dos custos de fabricação dos produtos norte-americanos, e
• reestruturar toda a concepção organizacional. O desperdício não se refere exclusivamente à subutilização dos materiais disponíveis, mas também à subutilização das pessoas. A transformação deveria ser gerada não por utilização de novas máquinas, mas por nova abordagem no que se refere à utilização das potencialidades do empregado.


Os Programas de Qualidade Total estão ligados aos modos pós-fordistas de organização do trabalho, que favoreceriam a participação dos trabalhadores nos processos de tomada de decisão nas empresas, contribuindo para a emergência de uma suposta democracia industrial.


Edward Deming- Estatístico norte-americano e um dos fundadores (1946) da Americart Society for Quality Control.



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Módulo 05 - Programa de Qualidade Total
A nova concepção de administração considerava que se deveria ajudar as pessoas a trabalharem de modo mais inteligente e criativo, e não a trabalhar mais. Contraditoriamente, o modelo de reestruturação proposto por Deming e Juran não sensibilizou o empresariado norte-americano, ainda muito influenciado pelos modelos taylorista/fordista.

Foi no Japão que a tese encontrou respaldo. Também é importante lembrar que as propostas estavam assentadas na ideia de cooperação e liderança, dois qualitativos estranhos e distantes da proposta taylorista/fordista. E foram esses modelos que formaram a cultura empresarial norte-americana. Era necessário, portanto, aliar-se necessidade de lucro, competitividade e produção ao ambiente cultural propício ao trabalho em equipe. Tal contexto foi encontrado no Japão.

A qualidade seria incorporada ao produto, durante o processo de produção, em vez de ser controlada apenas no final.



Deming e Juran - Juntamente com o engenheiro japonês Ishikawa, foram os que mais influenciaram os japoneses na formulação do modelo Total Quality Control (TQC), ao introduzirem os princípios sobre Qualidade Total no Japão, a partir dos anos 1950, na tentativa de auxiliar a recuperação da indústria nipônica.
A ideia central era de que a indústria japonesa deveria competir internacionalmente na base da qualidade, ao contrário do baixo custo, utilizando-se instrumentos para controle de processo estatístico, melhoria permanente - KAIZEN, e concentração no processo, não apenas nos resultados.




Kaizen significa melhoramento. Mais ainda, Kaizen significa contínuo melhoramento, envolvendo todos, inclusive gerentes e operários. A filosofia do Kaizen afirma que o nosso modo de vida - seja no trabalho, na sociedade ou em casa - merece ser constantemente melhorado.



Qualidade significa queda nos custos, em razão da eliminação dos fatores que encarecem a produção, ou seja, defeitos/desperdícios e retrabalho. O controle do desperdício seria de responsabilidade de todos os empregados - durante todo o processo produtivo - e não exclusivamente de um departamento.



Tela 3
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Na versão formulada por Deming, são propostos quatorze princípios norteadores:


• constância de propósitos;
• adoção da nova filosofia;
• introdução da qualidade, desde o primeiro estágio do produto;
• fidelidade ao fornecedor;
• melhoria constante do processo de produção ou da prestação de serviço;
• treinamento no local de trabalho;
• instituição da liderança;
• eliminação do medo;
• eliminação de barreiras;
• eliminação de lemas, exortações e metas para os trabalhadores;
• eliminação da administração por objetivos;
• garantia de que o trabalhador possa orgulhar-se de seu trabalho;
• instituição de programa de educação e autoaprimoramento;
• engajamento de todo o conjunto da empresa
.

Para as propostas principais, há um conjunto de fundamentos básicos que devem antecedê-las, para que a Qualidade Total seja implementada com êxito. Tais fundamentos básicos são:


• legitimidade da liderança;
• cooperação;
• harmonia no espaço organizacional;
• comprometimento de todos para que o resultado seja a qualidade;
• confiança entre os participantes do processo;
• convergência de ações.

Esses fatores combinados representariam efetiva mudança cultural em favor de completa identificação com a empresa. Com isso, o novo modelo procura substituir a figura do chefe/autoridade pela imagem do líder, no sentido de valorizar legitimidade, respeito, reconhecimento e admiração, que a liderança deveria despertar nos subordinados, e não aspectos ligados à hierarquia, distanciamento, temor e conflitos.



Tela 4
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Associado a esses aspectos, temos:


A eliminação do medo
- favoreceria a liberdade de expressão de ideias, de crítica, de sugestões e de exposição de dúvidas, imprescindível para criar o clima de colaboração e de cooperação desejado.


Os chefes (na antiga concepção taylorista) - seriam pessoas que influenciariam as demais para a aquisição de comportamentos positivos; estimulariam os empregados a obterem melhor desempenho. Aos líderes, portanto, caberia a tarefa de proporcionar, aos subordinados, satisfação e realização profissionais.


A ênfase na cooperação - expressar-se-ia na valorização do trabalho em equipe e, em consequência, na condenação da avaliação por desempenho, o que tenderia a inibir o trabalho.


Os aspectos comportamentais adquirem grande importância para a avaliação. Entre eles, destacam-se a dedicação, o esforço e a não adesão aos sindicatos, em concordância com a filosofia de colaboração que caracteriza a concepção dos PQTs.


Os empregados
, considerados o maior patrimônio da empresa, deveriam ser incentivados a participar de programas de treinamento, os quais teriam que ser amplamente utilizados.

No que se refere ao trabalhador, destaca-se a atitude de comprometimento com os objetivos da empresa, juntamente com a adesão a uma ética do trabalho, de tal forma que ele se transforme em preocupação central na vida do indivíduo. Supõe-se indispensável que se desenvolva o sentimento de pertencimento, com a finalidade de obter disposição para bom desempenho e cooperação, condição que favoreceria a vivência ou experiência de realização pessoal e reconhecimento profissional. Tudo isso, sem que haja, necessariamente, vantagens materiais, tais como: aumento de salário, promoção e melhoria nas condições de trabalho.



Tela 5
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Todas as recomendações definem estilo de gestão participativa, fundamentando-se, principalmente, na eliminação de barreiras entre chefia e subordinados com a tomada de decisão por consenso, traduzindo concordância geral e comprometimento do grupo como um todo.


De maneira abrangente, administração participativa é uma filosofia ou doutrina que valoriza a participação das pessoas no processo de tomar decisões sobre diversos aspectos da administração das organizações.
A participação das pessoas envolvidas nos diversos níveis de decisão contribui para aumentar a qualidade das decisões e da administração, bem como a satisfação e a motivação das pessoas.



Tela 6
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As propostas se apoiam em dois pressupostos. O primeiro indica que:

Não há necessidade de coagir, de controlar as pessoas para que elas desempenhem satisfatoriamente suas funções, pois elas próprias desejam realizar-se e alcançar metas, influenciar nas atividades e desafiar suas habilidades.

A tendência à valorização do trabalho poderia ser expressa, também, no princípio que enfatiza a necessidade da instituição de programas de educação e autoaprimoramento. Isso porque, segundo a visão dos teóricos da Qualidade Total, a organização não apenas precisa de gente boa, mas quem se aprimore sempre... e, ainda, de pessoas que queiram mais do que dinheiro, e sim oportunidades crescentes de contribuir com algo à sociedade.

A proposta é de transformação cultural que atingiria a empresa como um todo, incluindo a esfera gerencial e a alta gerência. Defende a:

• redução dos níveis hierárquicos de descentralização e de autogerenciamento de departamentos, setores, áreas, agências;
• delegação de tarefas e o compartilhamento de responsabilidades;
• circulação de informações (o negócio, a missão, os objetivos);
• divulgação e conhecimento amplo dos planos da empresa;
• transparência nas decisões.

O segundo pressuposto implica que as transformações no mundo do trabalho, nos valores e na mentalidade das pessoas, geradas pela busca da qualidade, assumiriam dimensão universalizante, capazes de desencadear mudanças na própria sociedade.

Tratar-se-ia, pois, de processo de racionalização que ultrapassaria os limites da fábrica, ou seja, a felicidade no trabalho estimularia as pessoas a canalizarem seu potencial mental para o benefício da sociedade. Cumprir-se-ia, assim, o ideal fordista de ser a fábrica - pela difusão de conduta metódica de trabalho - o princípio irradiador de novos padrões de sociabilidade, que orientariam para a conduta metódica de vida. A racionalização vivenciada no mundo das organizações expande-se para a vida social como um todo.



Tela 7
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2 - Relações empregadores-empregados

No que se refere às relações empregadores-empregados, a ênfase é posta nas atitudes de negociação, cooperação e solidariedade, uma vez que os trabalhadores são considerados os agentes da transformação da empresa.

Torna-se, pois, necessário ganhar confiança. Esse tipo de atitude pode representar ameaça ao movimento sindical, na medida em que as empresas tendem a adiantar-se, tomando iniciativas no que diz respeito às reivindicações dos trabalhadores e ao desenvolvimento de acordos e de negociações, embasando-as em vantagens mútuas.

No Brasil, os PQTs negam a importância da articulação com o movimento sindical, rejeitando qualquer tipo de negociação ou acordo com os sindicatos. Essa rejeição é justificada com o argumento de que não é necessário, pois as organizações se antecipam à intervenção sindical no atendimento às demandas dos empregados, em fornecer melhores condições de trabalho. Tal concepção consideravelmente discutida pelos sindicatos que afirmam que, com os PQTs, os trabalhadores passam a ser submetidos a nível muito mais elevado de dominação, com o agravante de que seus sindicatos, instrumentos históricos de luta na conquista de melhores condições de trabalho, são esvaziados.



Tela 8
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Na verdade, toda a lógica orientadora da concepção dos PQTs está calcada na priorização do cliente, e não na satisfação do trabalhador. Essa importante medida possibilita chegar-se à satisfação total do cliente. É de certa forma, a posição do trabalhador como simples engrenagem dentro de sistema amplo, que ele não controla, tal qual nos modelos taylorista e fordista, embora haja todo um argumento fundamentado na “valorização do trabalhador”. Talvez seja o caso de se lembrar de que, nas empresas que aplicaram os PQTs, os salários dos trabalhadores não melhoraram. Ao contrário, concretamente nota-se que se passou a trabalhar mais.


Nos PQTs ocorre uma sutil mudança, a qualidade é determinação do cliente e não do engenheiro, do marketing ou da administração geral. Ela está fundamentada na experiência exclusiva do cliente com o produto ou serviço; é medida pela confrontação com os requisitos do cliente formalmente estabelecidos ou não, consistentes ou superficiais, tecnicamente operacionais ou completamente subjetivos.

Quando se afirma que a prioridade na abordagem é dada ao cliente, é importante ter clara a dimensão dessa concepção. Não se trata apenas de satisfazer suas necessidades, mas de se apreender a sua expectativa, o que deseja e o que poderá vir a desejar. O levantamento das informações é realizado por meio de instrumentos, tais como pesquisa de mercado e conscientização dos empregados. A estratégia é transformar os funcionários em clientes. Por exemplo, os empregados que não estiverem em contato direto com o cliente externo deverão ver os seus colegas como clientes, os quais, igualmente, deverão merecer atitudes de presteza, dedicação e competência.



Tela 9
Módulo 05 - Programa de Qualidade Total
3 - Visão crítica aos PQTs

O que representa a estratégia organizacional centrar-se na satisfação do cliente?

O que significa o cliente ser o centro das exigências e, em nome dele, serem adotadas ações e tomadas iniciativas que pressionam os empregados?

A prática cotidiana das empresas, sobretudo aquelas dos países em desenvolvimento, tem como foco central a necessidade de garantir competitividade, produtividade e maior lucratividade.

A satisfação do cliente, de fato, estaria em contradição com as novas práticas de produção, planejadas para gerar obsolescência prematura dos produtos, tendo em vista manter ritmo adequado de consumo em fase de crise de mercados.

Essas questões caracterizam o modelo de Gestão da Qualidade Total e definem a sua novidade face às práticas de gestão tradicional.

Uma coisa é certa: a nova concepção supõe mudanças culturais, cuja extensão tende a afetar as relações de poder nas organizações. A abrangência de tais mudanças, no entanto, depende, para a sua efetivação e consolidação, da conjugação de fatores internos (mudança de cúpulas diretivas; formas de gestão da força de trabalho) e externos à organização (ação do mercado nacional ou internacional, do Estado e dos movimentos sociais).



Tela 10
Módulo 05 - Programa de Qualidade Total

Seria ingênuo acreditar que a simples reprodução de seus quatorze princípios seria suficiente para garantir a pretendida revolução cultural na administração, capaz de reverter os padrões tradicionais. A análise de casos concretos mostra que o mais frequente é a adoção de alguns princípios, de acordo com cuidadosa avaliação das condições da empresa, considerados diferentes fatores - Exemplo.

Em relação ao caráter supostamente democratizador dos novos instrumentos de gestão, entre eles os PQTs, tem sido observada a natureza restrita da intervenção dos empregados no cotidiano de trabalho.

Estudos mostram a insignificância do tempo dedicado aos mecanismos participativos, se comparado ao número de horas de trabalho. Há autores que acentuam a natureza contraditória das novas formas de gestão. De um lado, possibilitam a expressão dos trabalhadores e valoriza-lhes a capacidade de pensar e de propor ideias, capacidade totalmente ignorada pela gestão em moldes tayloristas. Dessa forma, transforma imediatamente os dados do quotidiano de trabalho taylorista, caracterizado pela exclusão da palavra e do saber.

Nesse aspecto, considerando-se a situação dos trabalhadores brasileiros, historicamente desvalorizados pelo autoritarismo dos empregadores e das gerências, aquelas possibilidades contribuiriam para ganho em relação à autoestima. De outro lado, porém, o conhecimento e a expressão dos trabalhadores são recuperados em proveito da empresa.

Parece claro, no entanto, que maior abrangência de tais mecanismos dependeria de fatores como poder de pressão e de barganha dos empregados. É, porém, justamente nesse aspecto, que os fundamentos da nova gestão podem interferir.



Por exemplo - A situação dos concorrentes, para otimização de resultados tendo-se em vista, sobretudo, a lucratividade - o que nem sempre está em consonância com os princípios participativos.




Tela 11
Módulo 05 - Programa de Qualidade Total

A lógica de funcionamento do Programa caracteriza-se por:


a) formulação ideológica e persuasiva, cujo objetivo é a adesão irrestrita e inquestionável do empregado,

b) ênfase em princípios essencialmente cooperativos e integradores que resultam no afastamento do espírito crítico e, em consequência, reduz a possibilidade de resistência. As novas formas de valorização dos empregados são, por eles, retribuídas com maior dedicação e espírito de lealdade. Obtém-se, assim, o engajamento moral, que tenderia a reforçar uma visão apolítica e paternalista, levando à perda da consciência coletiva e da reflexão crítica em favor de valores corporativos. Inclui-se, aqui, a rejeição da ação sindical pela organização.

Diferente de outras propostas (como a gestão participativa), o poder de barganha dos empregados fica, também, fragilizado face às condições do mercado em situação econômica desfavorável, evidenciada pelo crescimento do desemprego (resultado, entre outras razões, da utilização mais eficiente dos recursos humanos). Nessas condições, a tendência é de crescer a dependência dos empregados em relação à empresa e, portanto, a legitimidade desta última.



Tela 12
Módulo 05 - Programa de Qualidade Total

Resumo

O Programa de Qualidade Total tem como objetivos eliminar o desperdício e reestruturar toda a concepção organizacional. O desperdício não se refere exclusivamente à subutilização dos materiais disponíveis, mas também a subutilização das pessoas. A transformação deveria ser gerada não por utilização de novas máquinas, mas por nova abordagem, no que se refere à utilização das potencialidades do empregado. Os Programas de Qualidade Total estão ligados aos modos pós-fordistas de organização do trabalho, que favoreceriam a participação dos trabalhadores nos processos de tomada de decisão nas empresas, contribuindo para a emergência de uma suposta democracia industrial.

Um dos pontos mais importantes para que se consiga aumentar a produção com qualidade é a eliminação do medo e a criação de um ambiente de trabalho que favoreça a liberdade de expressão de ideias, de crítica, de sugestões e de exposição de dúvidas entre os empregados da organização. Os líderes e não chefes (na antiga concepção taylorista) seriam pessoas que influenciariam as demais para a aquisição de comportamentos positivos; estimulariam os empregados a obterem melhor desempenho.

A ênfase na cooperação expressar-se-ia na valorização do trabalho em equipe e, em consequência, na condenação da avaliação por desempenho, o que tenderia a inibir o trabalho. Nesta proposta de gestão, não há necessidade de coagir, de controlar as pessoas para que elas desempenhem satisfatoriamente suas funções.



Unidade 4 Módulo 1
Tela 13
Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

1 - O processo de trabalho

Segundo Marx, toda produção se caracteriza por dois elementos inseparáveis:

a) processo de trabalho, que dá conta da transformação da natureza que o homem realiza para convertê-la em um objeto útil, e
b) as relações de produção, que dão conta da forma histórica concreta na qual se realiza o processo de trabalho.

Processo de trabalho é o curso/modo/procedimento de transformação de um objeto em um produto determinado, esteja aquele em seu estado natural ou já trabalhado. É transformação efetuada por atividade humana, por meio de instrumentos específicos.

O momento da transformação é o momento determinante, o mais importante do processo de trabalho. Fala-se em processo de trabalho quando o objeto sofre um processo de transformação para chegar a converter-se em produto útil. Esta transformação se realiza mediante a atividade humana do trabalho, utilizando-se para isso de instrumentos mais ou menos aperfeiçoados do ponto de vista técnico.



Tela 14
Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

Os elementos do trabalho são:

1- O objeto sobre o qual se trabalha,
2- Os meios com os quais se trabalha, e
3- A atividade humana utilizada no processo.


a) O objeto sobre o qual se trabalha

Devemos distinguir dois tipos: a matéria bruta e a matéria-prima.

Matéria bruta é a substância que provém diretamente da natureza, aquela que o trabalho nada mais faz do que dela se beneficiar. Exemplos: as árvores que esperam ser cortadas nos bosques, o mineral que vai ser extraído das minas, etc.

Matéria-prima é a substância que já sofreu qualquer modificação efetuada pelo trabalho.

Exemplos: a madeira elaborada, o mineral purificado.
A matéria-prima pode constituir o elemento principal de um produto ou pode intervir apenas como matéria auxiliar.

As matérias-primas auxiliares são aquelas que:

  • Podem ser absorvidas pelo próprio instrumento de trabalho:
    carvão ou eletricidade pela máquina, o óleo pela roda etc.
  • Podem ser incorporadas à matéria-prima principal para operar nela uma transformação de caráter material: a tinta para o couro ou a lã, o cloro para branquear os tecidos etc.
  • Podem servir simplesmente para ajudar na execução de um trabalho, como no caso dos materiais destinados a iluminar ou aquecer os locais de trabalho.


Tela 15
Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

b) Meios com os quais se trabalha - Há dois tipos de meios de trabalho: um no sentido estrito e um no sentido amplo.

Marx denominou de meios de produção a matéria-prima (ou bruta) e os meios de trabalho em seu sentido amplo, devido ao fato de a produção de bens materiais não poder ser realizada sem a participação desses elementos.


Os meios de produção são constituídos pelo objeto sobre o qual se trabalha e por todos os meios de trabalho em sentido amplo.

c) Atividade humana realizada no processo de produção.

A atividade humana desenvolvida no processo de produção de bens materiais é chamada, corretamente, de trabalho. Esse trabalho que se expressa em certa quantidade de produtos implica o emprego de certa quantidade de energia humana.


Força de trabalho é a energia humana empregada no processo de trabalho.

A fadiga, após uma jornada de trabalho, não é senão a expressão física deste dispêndio de energia, produto da atividade humana desenvolvida durante o processo de trabalho. A boa alimentação e o descanso permitem recuperar a energia gasta.



Os meios de trabalho em sentido estrito são as coisas ou conjunto de coisas que o trabalhador interpõe diretamente entre ele e o objeto sobre o qual trabalha (matéria bruta ou prima). Servem de intermediários entre o trabalhador e o objeto sobre o qual trabalha. Exemplos: a serra e o martelo em uma pequena indústria de móveis; a máquina de costura em uma indústria de confecções; a pá mecânica na extração de minérios.



Os meios de trabalho em sentido amplo compreendem, além dos já citados no sentido restrito, todas as condições materiais que, sem intervir diretamente no processo de transformação, são indispensáveis à realização deste.
Exemplos: o terreno, as oficinas, as vias, os canais, as obras de irrigação e assim por diante.




Tela 16
Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

Não se pode confundir o conceito de trabalho com o de força de trabalho. Cada um deles se refere a realidades diferentes.

Um exemplo para tornar clara a diferença: da mesma maneira pela qual uma máquina produz um “trabalho” determinado em certa quantidade de horas (enlatar uma determinada quantidade de alimentos) e para realizar este trabalho emprega certa quantidade de energia elétrica; uma operária de uma fábrica de macarrão, em suas 8 horas de trabalho diário, consegue empacotar determinada quantidade de quilos de macarrão, e para realizar este trabalho despende certa quantidade de energia humana.


Portanto, a energia humana ou força de trabalho se diferencia do trabalho realizado, que não é senão o rendimento dessa força de trabalho.

Quando Marx fez a diferenciação entre o conceito de trabalho e força de trabalho, estava preparando o terreno para a sua teoria sobre a origem da exploração capitalista, que, segundo ele, conforme veremos a seguir, estaria na exploração da forma de trabalho.


Produto é o objeto final criado no processo de trabalho.



Tela 17
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2 - O trabalho: fonte de todos os valores

Todo o aparato conceitual formulado por Marx teve como fio condutor a tese segundo a qual o trabalho humano, essa capacidade de transformar matérias brutas em matérias-primas, é a fonte primeira do valor.

As máquinas, criadas pelo trabalho humano, por exemplo, não criam valor, apenas transferem valor. Uma máquina de soldar, por exemplo, não cria valor, ela simplesmente transfere um valor que foi criado pelo trabalhador no passado para o objeto que está soldando.

E esta é a principal contradição do capitalismo: o trabalho humano, fonte de todas as riquezas, não usufrui das riquezas criadas por ele mesmo. Embora tenhamos uma sociedade em que a produção é coletiva, por meio da divisão social do trabalho, a apropriação do fruto desse trabalho coletivo é privada. No capitalismo, o direito à propriedade privada sobrepuja-se ao direito à justiça e à igualdade. Esta contradição do capitalismo o leva a permanentes crises.

O pensamento de Marx é, portanto, uma interpretação do caráter contraditório ou antagônico da sociedade capitalista.

Para Marx, os conflitos entre os operários e empresários são o fato mais importante das sociedades modernas. De certo modo, todo seu pensamento é um esforço destinado a demonstrar que esse caráter contraditório é inseparável da estrutura fundamental do capitalismo. Para Marx, o que faz a história andar são os conflitos entre os interesses de classes.

Esta é a primeira ideia decisiva de Marx: a história humana se caracteriza pela luta de grupos humanos, das classes sociais.



“A história de toda sociedade até nossos dias é a história da luta de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de ofício e companheiro, numa palavra: opressores e oprimidos, se encontraram sempre em constante oposição, travaram uma luta sem trégua, ora disfarçada, ora aberta, que terminava sempre por uma transformação revolucionária de toda a sociedade, ou então pela ruína das diversas classes em luta.” (Manifesto Comunista)




Tela 18
Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

Para começar, a burguesia, classe dominante, é incapaz de manter seu poder sem revolucionar permanentemente os instrumentos da produção, sem racionalizar seus atos. Ou seja, no capitalismo há uma permanente busca para se combinar os meios apropriados aos fins, de forma a obter o máximo de resultado com o mínimo de esforços.

Para Marx, a burguesia não pode existir sem transformar constantemente os instrumentos de produção, portanto, as relações de produção. Esta característica diferencia o capitalismo de todos os outros sistemas econômicos, qual seja a busca permanente de transformar os meios de produção e, ao fazê-lo, também alterar as relações de produção.

Se concordarmos com Marx, que há uma relação entre meios de produção e relações de produção, também concordaremos que as novas mudanças tecnológicas e de gestão nas organizações criam novos tipos de relações. O desenvolvimento tecnológico (aqui ocupando o lugar dos meios de produção) exige um trabalhador com determinado nível de especialização. Isto cria, no ambiente organizacional, certo clima de medo ocasionado por novas e sempre prováveis mudanças que poderão, a qualquer momento, representar a “minha demissão”.

Este seria, portanto, um exemplo da relação direta que há entre meios de produção e relação de produção ao qual se referia Marx.



Tela 19
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As contradições geradas pelo capitalismo podem ser resumidas em dois pontos:

1. É a contradição entre as forças de produção e as relações de produção. A burguesia cria incessantemente meios de produção mais poderosos. No entanto, a distribuição de renda não se modifica no mesmo ritmo.
2. Há um aumento das riquezas e a miséria crescente da maioria. Dessa contradição sairá, um dia ou outro, uma crise revolucionária. O proletariado, que constitui e constituirá cada vez mais a imensa maioria da população, se constituirá em classe, isto é, numa unidade social aspirando à tomada do poder e à transformação das relações sociais.

Empenhados numa concorrência infindável, os capitalistas não podem deixar de aumentar os meios de produção, de ampliar ao mesmo tempo o número dos proletários e sua miséria. Os capitalistas não podem deixar de transformar a organização social.

O caráter contraditório do capitalismo se manifesta no fato de que o crescimento dos meios de produção, em vez de se traduzir pela elevação do nível de vida dos trabalhadores, leva a um processo de pauperização.



Tela 20
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Vejamos as principais teses de Marx:

1. Os homens entram em relações determinadas, necessárias, que são independentes da sua vontade. Em outras palavras, convém seguir o movimento da história analisando a estrutura das sociedades, as forças de produção e as relações de produção.

2. Em toda sociedade se pode diferenciar a base econômica, ou seja, a infraestrutura e a superestrutura. A primeira é constituída pelas forças produtivas e relações de produção, ou seja, a base econômica; na superestrutura figuram as instituições jurídicas e políticas, bem como os modos de pensar, as ideologias, as filosofias.

3. O motor do movimento histórico é a contradição, em cada momento da história, entre as forças e as relações de produção. As forças de produção são a capacidade de certa sociedade produzir; capacidade que é função dos conhecimentos científicos, do aparelhamento técnico, da própria organização do trabalho coletivo.

As relações de produção são caracterizadas pelas relações de propriedade. Em outras palavras, o movimento da história é constituído pelo movimento das forças produtivas, que entram em contradição, em certas épocas revolucionárias, com as relações de produção, isto é, tanto as relações de propriedade como a distribuição da renda entre os indivíduos e grupos da coletividade.

Nessa contradição, entre forças e relações de produção, é fácil introduzir a luta de classes. Basta considerar que nos períodos revolucionários, isto é, nos períodos de contradição entre forças e relações de produção, uma classe está associada às antigas relações de produção, que constituem obstáculo ao desenvolvimento das forças de produção, enquanto outra classe é progressiva, representa novas relações de produção.

4. Na sociedade capitalista, a burguesia está associada à propriedade privada dos meios de produção e, por isso mesmo, a certa distribuição da renda nacional. Em contrapartida, os trabalhadores, que constituem o outro polo da sociedade, representam outra organização da coletividade. Esse polo se torna, em certo momento da história, o representante de nova organização social, que será mais progressiva do que a organização capitalista, e marcará nova fase do processo histórico, com desenvolvimento mais avançado das forças produtivas.

5. Dessa relação das forças e das relações de produção, surge uma teoria das revoluções. Com efeito, dentro dessa visão histórica, as revoluções não são acidentais, mas sim a expressão de uma necessidade histórica. As revoluções preenchem funções necessárias e se produzem quando ocorrem determinadas condições.

6. Nessa interpretação histórica, Marx não distingue só a infra e a superestrutura, mas também a realidade social e a consciência: não é a consciência dos homens que determina a realidade, mas ao contrário, é a realidade social que determina sua consciência. Daí a concepção segundo a qual é preciso explicar a maneira de pensar dos homens pelas relações sociais às quais estão integrados.


Tela 21
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3 - Valor-trabalho

Segundo Marx, o valor de qualquer mercadoria é, de modo geral, determinado pela quantidade de trabalho social média nela contida. É o que chama de valor-trabalho. Toda mercadoria leva um tempo para ser produzida. O tempo que o trabalhador leva para produzi-la determina, portanto, o valor da mercadoria.

É importante não confundir valor com preço. O valor é determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessário para produção da mercadoria, enquanto no cálculo do preço de uma mercadoria outras variáveis interferem (como os outros insumos da produção, mecanismo da lei de oferta e procura, etc.).

Quando Marx formulou suas teses sobre o valor da mercadoria relacionando-o ao trabalho humano, tinha em mente que:


1) Todas as mercadorias são fruto do trabalho humano.

2) O cálculo do valor da mercadoria é igual ao tempo de trabalho necessário para sua produção.

3) A força de trabalho, no capitalismo, é uma mercadoria, mas é uma mercadoria diferente: é ela que dará vida a todas as demais mercadorias. As máquinas, quando estão em processo produtivo, nada mais fazem do que transferir valor cristalizado (ou trabalho morto, nas palavras de Marx) e não criam valor novo.

De fato, basta lembrarmos que o local onde se compra e se vende força de trabalho é chamado “mercado de trabalho”.

O valor do trabalho pode ser medido como o valor de qualquer mercadoria. O salário pago pelo capitalista ao trabalhador assalariado, como contrapartida da força que este último lhe vende, equivale à quantidade de trabalho social necessário para produzir mercadorias indispensáveis à vida do trabalhador e de sua família. O trabalho humano é pago pelo seu valor, de acordo com a lei geral do valor aplicável a todas as mercadorias.



Tela 22
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O tempo de trabalho necessário para o operário produzir um valor igual ao que recebe, sob forma de salário, é inferior à duração efetiva do seu trabalho e é o tempo de trabalho não pago pelo capitalista ao operário. Daí decorre o lucro do capital. A esse valor não pago, Marx chama de “mais-valia”. Vejamos um exemplo:

Um trabalhador é contratado para produzir sapatos, em uma jornada de trabalho de 40 horas semanais, portanto, 160 horas/mês.

Imaginemos que a produção de sapatos por operário ao longo de um mês seja de 100 unidades.

Supondo que o contrato de trabalho estabeleça que, por uma jornada de trabalho de 160 horas/mês, o nosso trabalhador receberá 500 reais, temos: 1 operário = 160 horas/mês = 500 reais/salário.

Pois então, provavelmente quando o empregado tiver cumprido 80 horas de trabalho já terá produzido 50 sapatos, que quando forem vendidos pagarão, com sobra, seu salário. Agora responda: o operário para de trabalhar quando produz os 50 sapatos?

Não, ele continuará produzindo sapatos por mais 80 horas, transferindo a energia da sua força de trabalho para transformar cola, couro, linha, tinta, sola em nova mercadoria: sapato.



Tela 23
Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

É, portanto, o trabalho humano, o único que tem a capacidade de produzir novas mercadorias. No entanto, no capitalismo, não há justa troca do tempo de trabalho, despendido ao longo da jornada de trabalho, com a remuneração.

Retornando ao exemplo, o trabalhador continuará a produzir valores, materializados em valor-sapato, por mais 80 horas sem remuneração. Aí está o segredo do capitalismo. É desse mais valor (mais-valia), não remunerado, que o capitalismo extrai sua taxa de lucro. Ou seja, o trabalhador produz, em 80 horas, um valor igual ao que está contido no seu salário, mas na verdade trabalha 160 horas. Portanto, trabalha metade do tempo para si mesmo e a outra metade para o dono da empresa.


A mais-valia é a quantidade de valor produzido pelo trabalhador além do tempo necessário, isto é, do tempo de trabalho necessário para produzir um valor igual ao que recebe sob a forma de salário.



Tela 24
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Existem dois procedimentos fundamentais para aumentar a mais-valia à custa dos assalariados, isto é, para elevar a taxa de exploração.

a) Um consiste em prolongar a duração do trabalho, ou seja, prolongar-se a jornada de trabalho, que Marx chamará de mais-valia absoluta.
b) E a mais-valia relativa que consiste em reduzir o mais possível o tempo de trabalho necessário, por meio do incremento de novas tecnologias. Isso explica o mecanismo da tendência pela qual a economia capitalista procura aumentar constantemente a produtividade do trabalho.

A mais-valia absoluta era típica do início do capitalismo, quando os trabalhadores cumpriam uma jornada de trabalho extenuante de 17 a 20 horas diárias. A mais-valia relativa é característica dos tempos modernos com o desenvolvimento tecnológico.

A origem do lucro, segundo Marx, é o modo como um sistema econômico em que tudo se troca de acordo com o seu valor, pode, ao mesmo tempo, produzir mais-valia, isto é, lucro para os empresários. Há uma mercadoria que tem esta particularidade de ser paga pelo seu valor, e ao mesmo tempo produzir mais que seu valor, é o trabalho humano.

Assim, quanto mais trabalho houver numa determinada empresa ou num determinado setor da economia, mais haverá mais-valia nessa empresa ou nesse setor.



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Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

Para sabermos o nível de desenvolvimento tecnológico de uma empresa, precisamos observar sua composição orgânica, ou seja, a relação entre o capital constante e o capital variável.

  • O capital constante é a parte do capital das empresas que corresponde às máquinas e às matérias-primas investidas na produção. O capital constante se transfere para o valor dos produtos sem criar mais-valia.
  • O capital variável é a parte do capital das empresas representado pela força de trabalho.

A mais-valia provém toda do capital variável, correspondente ao pagamento dos salários.

A modificação da composição orgânica do capital torna-se inevitável pela concorrência, e também pelo desejo dos empresários de diminuir o tempo de trabalho necessário. Com a globalização, o que acontece é a elevação permanente da composição orgânica do capital, e toda empresa que não consegue renovar-se permanentemente para manter-se no mercado, principalmente por meio da redução do capital variável necessário, perde em produtividade.

A concorrência das empresas capitalistas aumenta a produtividade; o aumento da produtividade se traduz normalmente pela mecanização da produção, isto é, pela redução do capital variável em relação ao capital constante. Em outras palavras, o mecanismo da concorrência de uma economia baseada no lucro tende à acumulação do capital, à mecanização da produção, à redução da parte do capital variável no capital total.

A permanente mecanização da produção tende a liberar uma parte dos operários empregados. Marx chama de exército de reserva os desempregados, fruto da introdução de novas tecnologias na esfera produtiva. Segundo ele, o desemprego é fundamental para o capitalismo, pois por meio desse exército de reserva, os capitalistas exercem o controle das ações dos operários, principalmente por meio do medo que provoca a ameaça de perda de emprego caso se venha a fazer greves e outros tipos de mobilizações. Ou seja, para Marx o desemprego é fundamental para o bom funcionamento do sistema capitalista, e não se constitui como um grande problema.



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Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

4 - A fábrica: local de extração da mais-valia

É importante se lembrar de que, para Marx, o local onde acontecerá o “milagre” da produção capitalista, ou seja, da extração da mais-valia, é a fábrica.

A fábrica tem suas próprias leis de funcionamento. Pode-se destacar: a padronização, a especialização e a sincronização.

Padronização. Para se obter a venda de produtos feitos em série, é necessário padronizar o gosto dos consumidores, fazendo-os desenvolver um gosto standard. Com o fordismo, principalmente, as pessoas deveriam se contentar com automóveis todos idênticos.

O emblema deste novo ciclo econômico é o modelo T, o automóvel inventado por Ford, em 1908. Até 1932, foram produzidos dezesseis milhões de exemplares que sofrem pequenas variações sucessivas, mas cuja estrutura permanece basicamente igual.

O slogan da Ford era: “Os americanos podem escolher carros de qualquer cor, desde que seja preta.” Um slogan que pressupõe uma massificação do gosto sem contestação.

Especialização. Levado às máximas consequências, muito diferente da adotada nos séculos anteriores. Taylor chega ao ponto de defender que cada trabalhador deve repetir milhares de vez por dia um só gesto (enroscar um parafuso, por exemplo, ou deslocar um material), para fazê-lo o mais mecanicamente possível.

Da especialização profissional dos cargos, deriva a especialização funcional dos espaços; em lugar do armazém, onde se produzia, por inteiro, um vaso ou uma carroça, surgem departamentos adequados a cada fase da produção. Aqui se produzem apenas parafusos, ali, unicamente tornos, e lá, somente brocas.

A cidade também se especializa: desenvolve-se a zona industrial, local onde se produz; os bairros residenciais, local onde se descansa; os bairros comerciais, locais em que são feitos compras; as zonas de lazer, lugar de diversão, etc. Trata-se da cidade funcional.

A sincronização. Se fôssemos artesãos numa oficina de vasos, cada um fabricaria um vaso inteiro. Se, ao contrário, trabalhássemos numa linha de montagem, você enroscaria um parafuso e, cinco segundos depois, eu deveria apertar outro: logo, deveríamos ambos estar presentes no instante que a cadeia se inicia. E bastaria que um de nós dois falhasse para que fracassasse toda a produção.

A fábrica sincronizada requer uma cidade sincronizada: para que todos estejam presentes na mesma hora, na própria linha de montagem (seja ela a autêntica cadeia de montagem das fábricas, seja a dos empregos burocráticos, nos escritórios), todo mundo tem que sair e voltar para casa no mesmo horário.



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Módulo 01 - A importância do trabalho para as organizações

Resumo

Para Marx, a fonte de todas as riquezas encontra-se no trabalho humano. Enquanto o trabalhador está no espaço da fábrica, o que ocorre, de fato, é a transferência de energia da força de trabalho, que dá vida às mercadorias.

O valor do trabalho pode ser medido como o valor de qualquer mercadoria. O salário pago pelo capitalista ao trabalhador assalariado, como contrapartida da força que este último lhe vende, equivale à quantidade de trabalho social necessário para produzir mercadorias indispensáveis à vida do trabalhador e de sua família. O trabalho humano é pago pelo seu valor, de acordo com a lei geral do valor aplicável a todas as mercadorias. No entanto, quando ele produz mercadorias suficientes para pagar seu salário, não para de trabalhar, a jornada de trabalho continua. É desse excedente que provém o lucro do capitalismo, no mais-valor que não é pago ao trabalhador. Há duas formas de mais-valia: a relativa e a absoluta.

O nível de desenvolvimento do capitalismo é medido por sua composição orgânica, ou seja, a relação entre o capital constante e o capital variável.



Unidade 4 Módulo 2
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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

1 - As organizações em xeque

No segundo semestre de 2003, a revista Exame publicou uma longa matéria sobre as novas relações humanas nas grandes organizações. Essa matéria nos dá um quadro trágico e pessimista dos resultados de novos modelos de gestão implementados nos últimos 30 anos que, em última instância, serviram muito mais para oprimir o trabalhador e diminuir sua qualidade de vida, do que a antiga promessa de felicidade.

Vale a pena discutir alguns dos casos apresentados. Segundo a matéria, o nível de insatisfação nos ambientes organizacionais chegou ao ponto que dois de cada três executivos pensam em mudar de emprego. É um problema imediato para milhares de pessoas e uma bomba-relógio para as empresas.

Algumas situações levantadas pela matéria:

  • Você se mata de trabalhar, e tem o mesmo tipo de resultado que fez o seu chefe subir ao posto em que ele está, mas não tem promoção.
  • Você enxerga uma oportunidade de mercado para a sua empresa, mas a matriz lá de fora não lhe dá autonomia para implementar o projeto.
  • Você cumpre todas as metas, mas isso só lhe garante metas ainda mais duras — e o seu salário está cada vez mais atrelado a elas.

Pois é, situações como essas se tornam cada vez mais corriqueiras no cotidiano corporativo, e levam grande número de executivos a se perguntar se ainda vale a pena trabalhar numa grande empresa.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Não há dúvida de que nos últimos tempos a vida ficou muito mais difícil.
Há mais pressão, menos autonomia, mais riscos, menos promoções. Numa enquete realizada no Portal EXAME, na Internet, mais de 90% dos 568 leitores, que afirmaram ser funcionários de grandes empresas, queixaram-se do aumento de pressão. E 68% deles pensam em deixar o emprego.

De cada três executivos, dois sonham sair. Talvez você esteja pensando que esse pessoal poderia ser justamente aquele que não está dando conta do recado, os profissionais que têm dificuldade em se adaptar às novas exigências do mundo empresarial.

Mas, veja alguns dos depoimentos de executivos prestigiados, escolhidos por suas empresas como parte daquela nata que elas pretendem manter a quase qualquer custo.

Esses três exemplos, de certa forma, revelam uma tendência geral dentro das organizações. A revista Exame conversou com presidentes de algumas das maiores empresas do país. As respostas sobre a vida nas organizações foram mais ou menos consensuais e apontam que a vida nas organizações está piorando.


"A ênfase na organização hoje é conseguir mais resultados com menos recursos, e mais rápido. Se hoje vendo x a um custo 100, amanhã tenho de vender 2x pelos mesmos 100. Minhas metas não são negociáveis. Quando tudo dá certo, o reconhecimento que recebo do chefe é só um: “Sabia que você conseguiria: qual a próxima meta?” Há três anos não tiro férias. Tenho milhas acumuladas na companhia aérea que não consigo usar. Minha válvula de escape é ter um plano B e um plano C: sou sócio de duas empresas menores e sinto que meus melhores momentos ainda estão por vir.”



“Tenho sido obrigada a gastar mais de 40% do tempo com questões que não agregam valor. A empresa se perde na obsessão por cortar custos a qualquer preço ou no jogo político cada vez mais intenso no primeiro escalão. Se você fica trancado ali, começa a fazer parte da doença sem perceber. Aos poucos, deixa de questionar e passa a fazer o básico, para evitar o desgaste. Hoje fico bem mais atenta às oportunidades fora da empresa.”



“Quatro anos atrás, a matriz checava muito pouco o que fazíamos por aqui. Hoje há mais controle e menos autonomia. As demandas de reestruturação não param de surgir. Os ganhos são cada vez mais atrelados aos resultados, diante de metas mais duras e de um mercado recessivo. Alguns níveis executivos foram cortados. Na estrutura anterior, eu seria diretor. Tenho bom salário, benefícios, e sou visto como um dos talentos da empresa. Ótimo, mas me pergunto: Quanto tempo aguento ficar?”



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

2 - Uma bomba-relógio?

O que parece hoje uma situação desconfortável para os executivos é também uma bomba-relógio para as empresas. Segundo Luiz Roberto Gouvêa, gerente-geral da consultoria de recursos humanos Towers Perrin,

“quando a economia se recuperar, o problema da insatisfação ganhará visibilidade e as companhias verão seus executivos mais valiosos saindo em busca de algo melhor”.

A insatisfação dos profissionais já está custando às empresas uma perda de intensidade no relacionamento e no comprometimento com seu empregador. Enquanto não pode sair, o empregado fica “cumprindo tabela”, como se diz na gíria. Mas a cabeça já não está lá. O executivo persegue o resultado com um pouco menos de empenho, não se esforça para ser tão criativo quanto poderia, economiza aquela dose extra de energia tão fundamental para a organização.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

As empresas estão ameaçadas de perderem as contribuições intelectuais das pessoas, e de terem profissionais que entreguem somente o suficiente, e não o extraordinário. Pressionados por um mercado cada vez mais competitivo e recessivo, as propostas das novas tecnologias de gestão podem declinar. E a criatividade e a motivação dos funcionários decrescerem.

Algumas empresas acreditam que são ilhas de bem-estar. É possível que não estejam enxergando o problema. “Não percebo uma insatisfação coletiva”, diz Elisabete Murad, diretora de recursos humanos da Xerox - companhia que passou por profunda reestruturação em seus negócios mundiais, demitindo 12.000 funcionários, sendo 3.100 deles na subsidiária brasileira. “Não há dúvida de que o executivo é mais exigido hoje. Mas as pessoas querem o desafio e continuam encontrando aqui oportunidades de desenvolvimento, reconhecimento e valorização.”

Outras companhias diagnosticam o problema, mas não sabem o que fazer. “Mais gente tem me procurado para falar sobre desempenho, e está ficando mais difícil gerenciar as expectativas”, diz Mário Fleck, presidente da consultoria Accenture.

Apresentada a questão desse modo, parece que as empresas de repente se tornaram más e os executivos são suas vítimas. Não é assim. O que acontece hoje é consequência de um conjunto de mudanças pelas quais vem passando o mundo das organizações.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Nas filiais das multinacionais, a crise e as descobertas de desvios contábeis nos Estados Unidos fizeram aumentar os controles da matriz, o que reduz a autonomia dos executivos locais.

Nas companhias nacionais, a globalização fez subir o nível de concorrência, gerando um aumento da pressão por desempenho.

Nas empresas em geral, a necessidade de resultados de curto prazo, que já vinha aumentando nos últimos anos, agora se tornou questão de sobrevivência. Com o processo de fusões e aquisições e com o enxugamento das empresas, há hoje muito menos postos aos quais os executivos possam ascender. Podem-se citar alguns exemplos de como essas mudanças se refletem no dia a dia:
“Quando entrei na EMC, em 1996, como engenheiro, havia a possibilidade de promoção a cada ano. Isso não existe mais. E não podemos criar expectativas de que vamos ter novos cargos gerenciais no curto e médio prazos", diz Edilson Fuzetti, hoje diretor-geral da empresa de tecnologia.

Apenas dois exemplos para se medir o nível de stress no ambiente organizacional:


  • Em todo o ano passado, a Nokia lançou nove produtos. Neste ano, com a mesma equipe, somente até agosto já foram 15.
  • No início de 2002, a Embratel reduziu de cinco para quatro o número de seus níveis hierárquicos, fundindo as vice-presidências com as diretorias. A quantidade de cargos diminuiu de doze para oito.


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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Mais do que desestímulo, o que se nota nessas mudanças é um momento delicado nas relações corporativas. Na década passada, o que se ouvia no mundo empresarial era uma defesa incondicional do capital humano. Era a “guerra pelos talentos”, espelhando a teoria de que o diferencial competitivo dos novos tempos não estaria mais em produtos ou tecnologia, mas em cérebros.

O discurso de que as pessoas são o principal ativo dos negócios se mantêm, mas agora as pressões competitivas estão mais visíveis do que o apreço pelos profissionais que se destacam.

"Talento não é descartável. Ao contrário: talento é um recurso raro e altamente disputado, mesmo num contato de crise como hoje. O que acontece é que a vida útil dele diminui. É como jogador de futebol: se aos 22 anos ele já está altamente estressado com a carreira, aos 30 não tem mais capacidade de aguentar um mercado como esse? Por isso, mesmo se ainda se encontram muitas pessoas ávidas por desafios e pressão, não significa que estejam imunes à deterioração do nível de vida nas empresas. Talentos sempre haverá, mas tudo indica que eles aguentarão menos tempo", afirma Sergio Lozinsky, sócio da IBM Consulting.


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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

3 - A balança virou

Nos últimos anos, demissões no alto escalão tornaram-se corriqueiras, e o topo das organizações transformou-se num lugar escorregadio. “Hoje as companhias não podem ter certeza de que vão manter os funcionários-chave para o seu sucesso. O novo modelo de relacionamentos é regulado pelas variações de humor do mercado, de forma que fica difícil pensar em contratos estáveis ou comprometimento de longo prazo", afirma o americano Peter Cappelli, diretor do Centro de estudos de recursos humanos da Escola de negócios Wharton, da Universidade da Pensilvânia.

Passamos do modelo do funcionário feliz para o do funcionário com medo. Na década de 1990, quem dava as cartas eram os profissionais. As empresas faziam filas nas portas das principais universidades e escolas de negócios para literalmente caçar os melhores alunos, às vezes ainda no meio do curso, e os headhunters viviam ocupados prospectando os talentos nas empresas concorrentes de seus clientes.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Atualmente, tudo indica que a balança virou para o lado das empresas. Elas são as procuradas. O que já era verdade no nível técnico tornou-se real também para os “talentos” executivos.
Ou seja, o que estes depoimentos nos dizem é que se está recuperando características do modelo tayloristas, mesmo em organizações que passaram por um processo de reestruturação gerencial. Podemos, também, refletir sobre a questão da busca pela consecução das metas, sentida pelos executivos, e seu impacto nos trabalhadores menos qualificados, que se percebem ameaçados pelo desenvolvimento tecnológico.

Por mais que se possa argumentar que a tecnologia também cria empregos, não se pode “tapar o sol com a peneira” e afirmar que o desemprego tecnológico não se constitui em um problema.

Vejamos um exemplo: enquanto você está lendo e estudando aí, sozinho, seja na sua casa, no seu escritório, você já se questionou quantos empregos o modelo de ensino a distância efetivamente elimina? Não pensa exclusivamente no corpo docente (que de fato é reduzido), mas em toda uma estrutura espacial que simplesmente desaparece (vigias, porteiros, faxineiras, cantinas, estacionamentos, etc.). Este é apenas um exemplo.

Pode-se pensar nos serviços bancários. Atualmente quase todos podem ser realizados em casa, via internet. Quantos postos de trabalho foram eliminados? Muitos responderão: “ora, isso é inevitável”. Talvez.

Não é nosso interesse fazer ataque ou defesa do desenvolvimento tecnológico, mas pensar, refletir, debater sobre os alcances e influências dessas rápidas e radicais transformações na cabeça dos trabalhadores, setor sem o qual a vida nas organizações não existe.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Vivemos uma época de medo e insegurança. Muito se falou de “novos modelos de gestão”, “novas tecnologias de gestão” (a reengenharia, a qualidade total, os modelos japonês, italiano e sueco) e parece que paira no ar um retorno ao taylorismo. Talvez pior: você se lembra do que Taylor afirmava? Ele dizia que a presença do capataz na linha de produção era importante para gerar medo nos operários e o medo era um fator importante, tipo de insumo invisível, para a produtividade. Por que piorou? Porque não é mais preciso a presença do capataz. O próprio trabalhador "se policia".

No entanto, vale ressaltar que muitas empresas que dizem ter realizado processos internos de reengenharia, qualidade total, etc., não abrem mão de utilizar as novas tecnologias para controlar seus funcionários, seja com câmaras de filmagem, ou com controle de entrada e saída, via cartões magnéticos.

Na verdade, essas questões nos põem diante da difícil e complexa tarefa de examinar sociologicamente a vida nas organizações em tempos de permanentes revoluções técnico-científicas. Quando se diz “sociologicamente” deve-se ter claro que estamos fechando o foco nas relações sociais.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Os novos estudos em ambientes organizacionais apontam que a sensação geral entre os empregados é que as empresas só querem saber dos negócios e estão cada vez menos preocupadas com as pessoas, como indicam as pesquisas de clima da consultoria de recursos humanos Hay.

De acordo com a Hay, de 2000 até hoje, têm-se mantido constantes as taxas de funcionários que acreditam que as empresas estão atentas ao negócio:


  • 83% dizem que a empresa se preocupa com a melhoria dos produtos e serviços;
  • 80% concordam que os líderes estão atentos às mudanças do ambiente externo;
  • Em compensação, o índice de empregados que responderam que os chefes conversam sobre as aspirações profissionais dos subordinados caiu de 54% para 34%.

O número dos que dizem haver boas oportunidades de carreira na empresa, que em 2000 já era de apenas 40%, caiu ainda um pouco mais para 37%. As mudanças no ambiente empresarial criam focos de tensão para os executivos, segundo um estudo da professora Betania Tanure, especialista em comportamento organizacional da Fundação Dom Cabral, de Belo Horizonte, que entrevistou 626 profissionais de várias das 500 maiores empresas do país.

Quando o trabalhador está em crise, podem-se observar três focos de tensões e de desajustes com a vida da organização:

“Existe atualmente um olhar mais crítico em relação à gestão, e isso acentua o desconforto”, afirma Betania.



Sensação de desajuste de tempo. “A conversa sobre a qualidade de vida se transformou numa questão para os executivos: todos falam mais sobre ela, mas ninguém sabe como resolver o problema”, diz Betania. Os profissionais ouvidos na pesquisa trabalham em média 11 horas e meia por dia, 68% trabalham regularmente nos fins de semana e 60% afirmam que a tecnologia da informação (leia-se rede interna, celulares, laptops) mais atrapalha do que ajuda, pois os torna “alcançáveis” a qualquer momento. Para essas pessoas, não existem mais períodos de pico no trabalho, mas um ritmo acelerado incorporado ao dia a dia.



Sensação de desajuste da competência. Por mais preparado que seja e por mais que se dedique ao trabalho, o executivo não tem certeza de que esteja conseguindo apresentar tudo o que é esperado dele nem de que seja tão competente quanto o mercado exige. Viver com a espada da competência na cabeça gera um estresse absurdo. Quem consegue dar conta do recado é premiado... com metas ainda mais agressivas.



Desajuste da afinidade e do orgulho. “É quando as pessoas questionam: ‘Eu gosto desta empresa? Será que me identifico com os valores, a cultura e o processo decisório desta organização?’”, diz Betania. É claro que perguntas como essas sempre foram feitas, mas hoje elas são mais frequentes.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

A tendência à crise dos trabalhadores aumenta também devido à pressão das organizações que, empurradas pela alta competitividade no mercado, impõe aos seus trabalhadores a necessidade permanente da reciclagem.

Nas oficinas artesanais, por exemplo, quando a família participava de todo o processo produtivo, as crianças cresciam ao mesmo tempo em que aprendiam, já produziam, e o “jeito de fazer” não mudava. Quanto mais tradicional, melhor.

No entanto, com a industrialização e a introdução da divisão do trabalho, esta situação sofre mudança radical. Como na sociedade industrial aquilo que se aprende serve por muito tempo, a formação pode limitar-se a um tempo determinado. Na sociedade pós-industrial, que estamos vivendo, este esquema entra de novo em colapso, pois, como as mudanças são contínuas, requerem uma formação também ininterrupta; seja na escola ou na universidade, ou no trabalho.

Por exemplo, atualmente na escola de executivos da Telecom, a empresa estatal italiana de telefonia, os engenheiros fazem cursos de atualização, que duram nove meses. Mas, no final do curso, parte do que aprenderam já se tornou ultrapassado, porque no meio um novo tipo de celular ou fibra ótica foi introduzido no mercado. E, é justamente isso que provoca medo, ansiedade no ambiente organizacional. Quando se supõe que se domina uma técnica ou uma rotina de trabalho, novos padrões, metas e desafios são apresentados.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

4 - O abismo entre pessoas e empresas

O que explica o mal-estar generalizado é um abismo crescente entre os profissionais e as organizações. Segundo estudiosos, a razão é que, ao longo do último século, os indivíduos evoluem muito mais do que as corporações.


“Os avanços na economia, no consumo, na educação e no acesso à informação deram origem a uma nova sociedade, formada por pessoas mais educadas, mais informadas, com mais experiências e com um sentido de individualidade mais apurado e complexo”, disse Shoshana. “As instituições do capitalismo gerencial, no entanto, não conseguem atender a essas pessoas. Elas continuam funcionando num modelo antigo voltado para as massas, focado mais na realidade interna do que na externa e apoiadas principalmente em estruturas de comando e controle."

A consequência é que os indivíduos acham cada vez mais difícil acreditar que as organizações sejam capazes de atender a seus interesses, seja como consumidor, seja como funcionário. O que estudos mostram, portanto, é um fosso entre indivíduos modernos e uma mentalidade corporativa antiquada. Mas há ainda o fosso contrário, apontado por psicólogos como José Ernesto Bologna, da Ethos Desenvolvimento Humano e Organizacional: aquele entre a pós-modernidade das empresas e os anseios tradicionais das pessoas.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais


“A velocidade das mudanças e a pressão pelo resultado imediato deram origem a uma cultura que sacrifica as relações, justifica a traição e faz que fiquem em segundo plano alguns valores simbólicos essenciais para o ser humano — como o sentido de pertencer a um grupo, de conhecer as regras do jogo e de saber o que será recompensado e o que será punido”, afirma Bologna.

“O resultado é um clima de insegurança cultural: as pessoas sentem que ficou muito mais perigoso colocar fé naquele sistema.”

Se essas análises estão corretas, por que o sistema ainda sobrevive?

Segundo Betania, da Fundação Dom Cabral, trata-se de uma situação temporária. “Soa dramático, mas, no geral, as empresas enxergam da seguinte forma: o modelo não é sustentável do ponto de vista do indivíduo, mas está sustentável do ponto de vista da organização”, diz ela.

Estar sustentável não significa, no entanto, que o modelo esteja confortável. Várias empresas notam os sintomas de crise.
“Nos últimos tempos, as pessoas passaram a me procurar mais”, diz Jair Pianucci, diretor de recursos humanos da FIE. “Antes de desabafar, elas pedem para eu tirar o crachá”

As principais queixas, segundo Pianucci, são a perda de poder de decisão e as inquietações do dia a dia. Mesmo empresas que praticam a chamada administração participativa, inclusive as que cultivam o modelo do funcionário-acionista, vêm sendo afetadas. É o caso da Promon, um grupo de engenharia e tecnologia cujo controle acionário pertence aos funcionários.
“Existe um novo paradigma de comprometimento que está dificultando a atração e a retenção de bons profissionais”, afirma Luiz Ernesto Gemignani, presidente da Promon.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

"A nova geração de talentos é formada por pessoas menos comprometidas com a empresa.” Isso se reflete na adesão ao modelo de controle acionário: em 1998, 87,5% dos profissionais de 25 a 30 anos eram acionistas da empresa. Hoje, a taxa é de 54,3%.

Preocupado, Gemignani muniu-se na última semana de junho com 50 funcionários para debater a questão. Um dos motivos apontados para a queda de interesse foram as demissões do ano passado, quando a empresa teve de cortar seu quadro pela metade. “Não saíram só os de desempenho baixo, foi um corte na carne. As pessoas interpretaram assim: a empresa quer comprometimento, mas não pode oferecer garantias?", diz Gemignani.

Diagnosticar o problema é muito mais fácil do que resolvê-lo. “Estamos tratando uma doença nova com mecanismos antigos. Enquanto não encontrarmos um antídoto, o que podemos fazer é reconhecer que existe uma questão e tentar amenizar pelas bordas?", diz Pianucci, da HP. Recentemente, a diretoria da HP reuniu-se para discutir um dos principais problemas apontados pelos funcionários: excesso de trabalho.

Foi criado um grupo de estudo com profissionais de diversos níveis que terá 30 dias para fazer um diagnóstico, 60 para sugerir soluções e 90 para implementá-las. Com um detalhe: a turma deverá partir do pressuposto de que o volume de trabalho não vai diminuir!

Na Accentute, os líderes estão sendo orientados a filtrar melhor a pressão e há massagistas no escritório uma vez por semana pata atender os mais estressados. “Resolve? Claro que não”, diz Fleck. “Mas é uma forma de dizer: reconhecemos que vocês estão pressionados

Até mesmo os executivos da AmBev, famosa por sua cultura aguerrida de busca de resultados, estão atentos. “Se não tomar conta do modelo abrasivo, você corre o risco de deteriorar o relacionamento entre as pessoas e a empresa”, diz Magim Rodrigues, que, em janeiro de 2004, trocará a presidência executiva pela vice-presidência do conselho de administração da cervejaria. Os excessos causados pela busca de resultados a qualquer preço - característica do modelo AmBev de gestão - foram constatados há cerca de dois anos, na forma de exageros na área de pessoal: para fechar suas metas, os gerentes não titubeavam em apertar os custos, cortando, inclusive, gastos com salário e treinamento. “Hoje eles continuam tendo autonomia para fazer o que for necessário pelo resultado”, diz Magim. “Mas não podem mexer na política de pessoas”.



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Módulo 02 -Insatisfação e crise em ambientes organizacionais

Resumo

Atualmente as grandes organizações vivem uma crise sem precedente histórico. Pressionadas pela alta competitividade do mercado, as organizações passam a exigir de seus funcionários metas cada vez mais rígidas. Os procedimentos de controle, próprio do modelo taylorista, são revigorados. Essa conjuntura gera nos profissionais uma insatisfação que se reflete no pouco entusiasmo e envolvimento com os objetivos da organização.

A sensação de desajuste de tempo, de desajuste da competência, e de afinidade com as metas da organização, é consequência desse processo de crise. O desafio atual é encontrar novas formas de gestão que, de fato, considerem os profissionais como parte fundamental do processo produtivo.



Unidade 4 Módulo 3
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Módulo 03 -Situação do trabalho em tempos de globalização

1 - Reinventar a empresa?

O fato é que o acirramento da competição, a crise econômica e a exigência de resultados de curto prazo deixam pouca margem de manobra. Transformadas em panelas de pressão, as empresas sentem a insatisfação aumentar, e isso lhes causa problemas sérios de motivação e preocupação com retenção dos funcionários. Mas o que é possível fazer? Há quem acredite que as corporações terão de amenizar sua obsessão pelo desempenho a qualquer preço. Uma cultura bem construída não sacrifica as relações em nome do resultado.

A cultura atual, no entanto, está sustentada num artificialismo brutal. Com isso, fica mais difícil conseguir a coesão e a sintonia das equipes? Se não chega a ser utópico, já que existem casos de companhias ou departamentos que atuam dessa forma, em geral esse tipo de solução parece bastante improvável.
“Digo aqui dentro: não existe decreto que possa parar esse processo de busca por resultados. Só uma empresa irresponsável faria isso”, afirma Fleck.

A diminuição de pressão é improvável, até porque as pessoas estão imbuídas do mesmo espírito. “Outro dia perguntei a alguns líderes o que é ter sucesso”, diz Marcos Cominato, diretor de RH da Nokia. “A resposta que obtive foi: galgar níveis mais altos no menor tempo possível. Para ele, o cotejo entre essas expectativas altas e a realidade oferecida acaba dando margem a conflitos. “As chances de a maioria estar descontente é muito grande”, afirma Cominato.

Embora se diga há mais de uma década que o mundo em que vivemos mudou, que longevidade no emprego e garantia de ascensão contínua na carreira são valores fora de moda, os profissionais ainda se comportam em grande medida como no passado. “A maioria das pessoas que me procuraram para aconselhamento de carreira e estão atrás de um novo emprego continua buscando os modelos antigos”, diz Saulo Lerner, diretor responsável por altos executivos da consultoria Right Saad Fellipelli. Ou seja: esse pessoal quer segurança, salário, benefício, autoridade formal, promoções e título.



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Módulo 03 -Situação do trabalho em tempos de globalização

Outra corrente de analistas sugere que a solução é reinventar a grande empresa, para que ela funcione como se fosse pequena. “Grandes estruturas, para funcionar, precisam de sistemas rígidos, chefes e controles. É uma abordagem mecanicista, não uma abordagem natural”, diz o consultor Oscar Motomura, fundador da Amana-Key, empresa de treinamento de executivos.

Essa opinião tem amparo em várias pesquisas científicas. “Sociólogos já reconheceram há muito tempo que os negócios com menos de 200 indivíduos podem operar com fluxo livre de informações”, diz o psicólogo Robin Dunbar, da Universidade de Liverpool. Com mais de 200 pessoas, a organização perde o senso de comprometimento individual e o reconhecimento das especialidades de cada um, que tanto ajudam a fortalecer o grupo. “Em grandes estruturas, os favores são claramente um toma-lá-dá-cá, em vez de uma obrigação comum”, diz Dunbar.

A Gore Associates, multinacional americana de alta tecnologia, que produz tecidos impermeáveis, fio dental, isolantes para cabos de computadores e vários tipos de cartucho para a indústria, tenta reinventar os vínculos entre seu pessoal. A companhia fatura 1 bilhão de dólares por ano e emprega 7.000 funcionários, mas nenhuma divisão de negócios tem mais de 200 pessoas. Se uma unidade cresce, além disso, é dividida. A frustração de um dos fundadores, Bill Gore, com a burocracia das grandes organizações deu origem a uma cultura não hierárquica, que valoriza a autonomia e o empreendorismo. Não há organograma, não há chefes, não há plano de carreira e nem canais estruturados de comunicação. Ninguém tem cargo, são todos “associados”.

Algo que se aproxima disso no Brasil é a cultura da construtora Odebrecht, onde não há departamentos e cada equipe é uma unidade de negócio, como se houvesse pequenas empresas dentro da grande. “É uma confederação de funcionários-parceiros, na qual o sujeito vê o resultado e participa dele”, diz Sergio Foguel, membro do conselho de administração da Odebrecht. Cada líder é responsável por um centro de resultado e tem uma empresinha para gerir. O foco do REI não é dar benefícios. O plano de saúde existe, mas é opcional, ou seja, o profissional que tiver interesse em comprá-lo deverá geri-lo em todos os aspectos.“O importante para nós é que o sujeito cresça, remunere-se e faça sua poupança”, diz Foguel.



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2 - A gestão do vínculo.

Especialistas afirmam que salário e desafios já não são mais suficientes para motivar os executivos. “A retenção estará cada vez mais baseada em aspectos culturais. A gestão do vínculo está ficando muito mais complexa.”, diz o headhunter Luis Carlos Cabrera, da PMC Amrop. Isso não está passando despercebido para as empresas.

“Retenção como conhecemos é coisa do passado”, diz Cominato, da Nokia. “As empresas têm de se esforçar para criar causas que tenham valor para as pessoas e fazer com que se identifiquem com a cultura.” Para Cominato, “chegou o momento de fazer o alinhamento entre a nova cara das empresas e as expectativas das pessoas”.

Às vezes, o caminho é alinhar a velha cara das empresas. A Johnson & Johnson (J&J) segue desde 1943 o credo de que seus objetivos são atender, nesta ordem, o cliente, o funcionário, a comunidade e só então o acionista.

“No final dos anos 1990, os funcionários avaliaram que não estávamos correspondendo às premissas no que dizia respeito a eles", diz Nilson Salustiano Gomes, diretor de recursos humanos da J&J.
Menos de 60% — padrão da cúpula mundial — disseram que o credo estava sendo seguido corretamente. No ano passado, o índice subiu para 67%. Como? "Tentamos desestimular uma cultura que valorizava longas jornadas”, diz Salustiano. Hoje há um toque de recolher às 18 horas, no QG da empresa, nas proximidades da Cidade Universitária de São Paulo. A empresa também incentiva o uso de roupas mais informais. Além disso, o negócio começou a ser reestruturado por processos, aspecto que ajuda aos empregados a perceber o impacto direto do seu desempenho na organização, principalmente para os de nível gerencial.

“As pessoas insatisfeitas são aquelas que não se identificam com a cultura da organização”, diz Fábio Barbosa, presidente do ABN Amro Real, banco que vem apostando alto na formação de imagem de respeito à sociedade e transparência. “Nosso mote é: é possível dar certo fazendo as coisas do jeito certo”, diz Barbosa e “ O elemento central do vínculo entre funcionários e empresa é a identidade de valores. Segundo Motomura, da Amana-Key, as pessoas precisam sentir que seu trabalho tem significado e que elas fazem parte do processo de decisão.



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Como construir uma cultura empresarial saudável, que valorize a participação dos empregados? Betania Tanure, da Fundação Dom Cabral, sugere:


  • Consistência entre o discurso e a prática.
  • Significado de justiça: o executivo pode até não concordar ou se sentir pressionado, mas percebe que há justiça no processo.
  • Acolhimento: As pessoas não estão se sentindo acolhidas nas grandes estruturas.

Talvez a resposta seja um pouco de cada coisa: encontrar formas de amenizar a pressão e lidar com as expectativas, criar estruturas de convivência menores e mais flexíveis, dar sentido ao trabalho e participação nas decisões. Nada disso é fácil. Mas é neste momento, de mercado favorável ao empregador, que as companhias precisam agir.
“Que tipo de cultura empresarial deverá existir para que seja possível reter as pessoas?”, questiona Foguel, da Odebrecht, "temos de refletir. O paradoxo é que isso esteja acontecendo num momento de grande desemprego. Imagine o que vai ocorre quando o mercado melhorar e surgirem novas oportunidades."



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3 - As histórias de cinco executivos

Se a vida nas grandes corporações está tão ruim, seria de se esperar que houvesse um êxodo para as pequenas e médias empresas, além de uma onda de novos empreendedores. Não é o que vem acontecendo, pelo menos não em grande escala - provavelmente porque se a vida já anda dura nas grandes companhias, fora delas está duríssima.

Segundo a Global Entrepreneurship Monitor, que analisa o empreendedorismo em 37 países, mais da metade dos empreendedores brasileiros cria a própria empresa por pura necessidade. Mas há, também, os que, mesmo bem-sucedidos numa grande organização, decidem sair. “O risco de ser executivo está cada vez mais próximo do risco de empreender. E, em tempos de corte de custos, os que gostam de criar valor se cansam de vê-lo ser destruído nas grandes empresas.”, diz Marília Rocca, diretora-geral do Instituto Empreender Endeavor, organização não governamental de apoio ao empreendedorismo.

Veja, a seguir, os casos de cinco executivos que optaram pela saída, e por quê:

  • De franqueador a franqueado - O paulista Michel Brull tornou-se presidente da Fotoptica, a maior e mais tradicional rede de lojas de foto e óptica do país, em 2000. Após uma fase de crescimento acelerado, os resultados começaram a refletir a queda no consumo e o aumento do dólar, que balizava parte dos custos. Brull desenvolveu então diversos planos de redução de custos e articulou uma estratégia para a abertura de lojas franqueadas. "A partir daí teríamos de cortar mais custos e manter o plano das franquias, que já estava pronto. Foi quando percebi que o projeto Michel e o projeto Fotoptica não caminhavam mais juntos.” A solução estava logo ali: aos 46 anos, Brull tornou-se franqueado da rede que dirigia. Hoje, os aspectos que considera mais importantes são a autonomia e a chance de trabalhar em algo que lhe dê prazer. Ele possui três lojas em Campinas, no interior de São Paulo, e tem planos de incorporar outras.


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  • Fugindo dos incêndios - Jacques Wladimirski, aos 42 anos, deixou uma carreira de duas décadas em grandes empresas, como Black & Decker, DirecTV e lntelig, para fundar a Golf & Gym, uma academia e escola de golfe voltada para eventos de negócios. Seu último cargo tinha sido de diretor-superintendente da Líder Táxi Aéreo. Wladimirski se lembra que se decepcionou com o mundo corporativo, pela primeira vez, ao ver um trabalho de um ano à frente da UUNet, prestadora de serviços de transmissão de dados, ir por água abaixo, quando a controladora WorldCom decidiu fundi-la com a Embratel. “As companhias perderam a visão de planejamento estratégico. Em geral, a rotina diária é administrar incêndios, e não entender o que, e o porquê está pegando fogo."
  • As metas imutáveis - Vanderlei Rigatieri, aos 41 anos, enviou uma mensagem aos colegas informando sua saída da presidência da subsidiária brasileira da Avaya, fabricante americana de equipamentos para telecomunicações. “Saí para procurar um ambiente em que não imperassem as metas do tipo de canhão, que não mudam de rota. Se você diz para a matriz que a realidade local é diferente, a resposta é: " Estou pouco ligando", diz Rigatiere. Esse tipo de postura gera insatisfação. As pessoas tendem a se tornar mais agressivas. A pressão de curto prazo contamina a estratégia. Hoje, Rigatiere é sócio e diretor-geral da DGX, uma prestadora de serviços de tecnologia.
  • Sem espaço para ideias - Márcio Xavier, recorda que participou, há alguns anos, de projeto pioneiro em um grande fabricante de fragrâncias europeias. A ideia era enviar pesquisadores à Amazônia para trazer novas essências, mas o projeto não saiu do papel. “As empresas estão cada vez mais condicionadas à competição por autos. As decisões são, sobretudo, financeiras. A ordem subliminar é arriscar o mínimo para garantir própria sobrevivência. Em geral, não tem havido muito espaço para desenvolver rapidamente as ideias,” diz Xavier. Ele deixou a diretoria para a América Latina da fabricante de fragrâncias para fundar, com três amigos, a Anantta, produtora de cosméticos e perfumes, com sede em São Paulo. Em apenas um ano, a Anantha lançou uma linha de três perfumes.
  • A ditadura dos trimestres - O clímax da carreira do executivo Ricardo Cidale ocorreu quando foi promovido à vice-presidente comercial da matriz da empresa de tecnologia Real Networks, nos Estados Unidos. Poucos meses depois, no entanto, começou a questionar o rumo de sua vida profissional. “Vivia de trimestre em trimestre sem planos de médio e longo prazo”, diz. Percebi que, se continuasse ali, iria enferrujar o que aprendi sobre planejamento estratégico. Cidale é conselheiro de empresas emergentes, como as de tecnologia Gemco e Automatos. E mora em Búzios, no litoral do Rio de Janeiro, com a mulher e o filho.


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4 - Desemprego no mundo

Vivemos momentos de profundas mudanças no mundo de trabalho, decorrentes das inovações tecnológicas e organizacionais. Vale lembrar uma passagem do texto de Marx:

“Impelida pela necessidade de mercados sempre novos, a burguesia invade todo o globo. (...) Pela exploração do mercado mundial a burguesia imprime um caráter cosmopolita à produção e ao consumo, em todos os países. Para desespero dos reacionários, ela retirou da indústria sua base nacional. As velhas indústrias nacionais foram destruídas e continua a sê-lo diariamente. São suplantadas por novas indústrias, cuja introdução se torna uma questão vital para todas as nações civilizadas, indústrias que não empregam mais matérias-primas autóctones, mas sim matérias-primas vindas das regiões mais distantes, e cujos produtos se consomem não somente no próprio país, mas em todas as partes do globo. Em lugar das antigas necessidades, satisfeitas pelos produtos nacionais, nascem novas necessidades, que reclamam para sua satisfação os produtos das regiões longínquas e dos climas mais diversos. Em lugar do antigo isolamento de regiões e nações que bastavam a si próprias, desenvolvem-se um intercâmbio universal, uma universal interdependência das nações.”(Manisfesto Comunista, pág. 24)



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Historicamente, o capitalismo teve que revolucionar constantemente as forças produtivas, bem como as próprias relações sociais de produção. O desemprego estrutural desde o fim de século demarca não apenas o aumento do exército de reserva, mas especialmente o excedente de trabalhadores, ou seja, a não necessidade, para a produção de milhões de trabalhadores.


A tecnologia está substituindo a principal força produtiva: o trabalhador. Em consequência, milhões de trabalhadores perdem seus empregos em toda parte de mundo. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o desemprego e o subemprego atingem cerca de 1 bilhão de pessoas só na periferia do capitalismo.

O desemprego, no entanto, não atinge exclusivamente os trabalhadores não qualificados. Os trabalhadores qualificados também continuam perdendo seus empregos. Na Alemanha, atualmente, quase um milhão de operários qualificados e 75.000 engenheiros, economistas de empresa, físicos e químicos na sua maioria com menos de 35 anos de idade, estão sem emprego.

O desemprego dos trabalhadores qualificados triplicou em dez anos.


  • 75% das alemãs que se formam só encontram trabalho pouco ou não qualificado.
  • Na França, 25% dos novos desempregados fizeram pelo menos dois anos de estudos superiores.
  • Nos Estados Unidos e na Inglaterra, 30% dos estudantes que vão se graduar engrossarão diretamente as fileiras dos desempregados ou subempregados.
  • Atualmente, 90% dos empregos criados são precários, em tempo parcial e com salário parcial (contra 65% durante os anos 90).

O núcleo representado pelos trabalhadores estáveis, permanentes, não cessa de diminuir, enquanto o número de trabalhadores precários, terceirizados, em tempo parcial, cresce a cada dia. Esse quadro expressa bem a crise estrutural vivida pelo capital.



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Empresas como a Nike pagam às trabalhadoras um salário mensal de US$ 38. O mesmo ocorre com outras empresas como Walmart, Kmart e Sears, em Bangladesh, que pagam às trabalhadoras, por uma jornada de trabalho de 60 horas semanais, um salário mensal de US$ 30.

A Sony informou, em outubro de 2003, que cortará 13% de seu quadro de funcionários em todo o mundo, o equivalente a cerca de 20 mil pessoas, ao longo dos próximos três anos. Só no Japão serão fechadas mais de 7000 vagas, as outras 13 000 serão distribuídas por suas filiais em todo mundo.
O objetivo dessas demissões é ganhar competitividade. Divisões serão integradas, e cargos que se sobreponham, eliminados. Além disso, a Sony formará uma joint venture com a sul-coreana (e concorrente) Samsung para a produção de telas de cristal líquido.

A Sony planeja trabalhar com uma margem de lucro de 10%. Hoje, devido à acirrada competição e aos elevados estoques, essa margem está em 2,5%.

Em abril de 2003, a empresa surpreendeu os investidores de todo o mundo depois de ter relatado um prejuízo de quase 1 bilhão de dólares no primeiro trimestre do ano.

Ao contrário do que prenunciam alguns entusiastas do fenômeno da globalização, intensificam-se as contradições de classes e a anarquia na produção, que se expressam nitidamente nas formas antediluvianas de superexploração, bem como no desemprego estrutural, na desregulamentação das conquistas históricas dos trabalhadores, no trabalho em tempo parcial, na precarização das condições de trabalho em tempo parcial, e na miséria crescente e pauperização crônica – que grassam desde os países centrais aos países periféricos. Para manter-se, o capital cria também outras formas de controle social, tais como: controle efetivo da produção, controle dos tempos e movimentos, novas formas de gestão da força de trabalho, flexibilização do trabalho, reestruturação produtiva (CCQ, TQC, JIT, KAIZEN, KANBAN, gestão participativa, trabalho em grupo, etc.).



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O desemprego no Brasil - Pesquisas revelam que o trabalhador brasileiro está mais produtivo, mas nem por isso está ganhando mais dinheiro.

Levantamento feito com 42 setores da economia revela que, de 1991 a 1998, a produtividade por empregado aumentou, em média, 2,5% ao ano, ou 19,1% no período, um aumento igual ao da economia norte-americana.

Isso significa que o operário que produzia cem canetas em 1991 passou a fabricar 119 unidades em 1998, no mesmo espaço de tempo. Só que, enquanto isso, de 1990 a 1999, a participação do salário na composição do Produto Interno Bruto (PIB) caiu oito pontos percentuais, de 45% para 37% respectivamente.

Há vários setores em que a renda real do empregado até caiu, como o de refino de petróleo, farmacêutico, perfumaria, café, leite, laticínios, óleos vegetais, comunicações e construção civil. É o que constata trabalho do Ph.D. em Economia, Regis Bonelli, pesquisador associado do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Entretanto, ele não viu relação entre ganhos de produtividade e queda de preços.

O trabalhador saiu perdendo nessa década, porque nos anos 1990 ele ficou muito mais preocupado em manter o emprego do que em aumentar o salário. O desemprego faz com que os sindicatos percam poder de negociação. Além disso, para poder competir, as empresas tiveram de reduzir custos, o que significa, entre outras medidas, evitar reajustes salariais.

Os salários dos metalúrgicos da região metropolitana, por exemplo, não acompanharam sequer a inflação. O ganho médio anual de produtividade do trabalhador brasileiro, de 2,5%, é parecido com o de um país desenvolvido, mas ainda é baixo para um país em desenvolvimento.



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Alguns setores, porém, conseguiram até superar isso. Pelos cálculos do economista, a produtividade do trabalhador do setor de extração de petróleo, gás, carvão e de combustíveis subiu 11,73 ao ano. Os setores da economia brasileira que mais cresceram foram os produtores dos chamados “bens modernos”.

O IBGE identifica uma queda de oito pontos percentuais na participação do componente trabalho (remuneração dos empregados) no PIB.

O trabalho correspondia a 45% da renda nacional nos anos 1990. Agora, caiu para 37%. A remuneração do capital (remuneração das empresas depois do pagamento de imposto) subiu de 33% para 41% no período. O que falta para completar refere-se aos impostos – ou à participação do governo.

Ao mesmo tempo, as empresas investiram em tecnologias e os aluguéis subiram (ambos são componentes do capital) nos anos 1990. Como esses ganhos não foram repassados aos salários, veio a queda da participação do trabalho.

Segundo alguns economistas, essa situação deve persistir por mais algumas décadas no Brasil. Para que ocorra uma inversão, é preciso que o trabalho seja mais valorizado e a indústria esteja bem diversificada para absorver a mão de obra desempregada.

Na França, em meados dos anos 1980, com a mudança do processo de produção, toda a sociedade foi envolvida (universidades, patrões e empregados) para assistir à chegada da informática.

No Brasil, o quadro foi distinto. Não houve preparação, acabou-se, portanto, implementando-se uma política de defesa.

No entanto, parece que o medo do desemprego é um fantasma que continua rondado o mundo das organizações e produzindo medo nos trabalhadores.



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Resumo

O mundo globalizado desenhou uma nova relação entre capital e trabalho. Segundo os dados disponíveis, os salários dos trabalhadores, qualificados ou não, sofreram perdas consideráveis nas duas últimas décadas. Essa realidade não está limitada aos países pobres ou em via de desenvolvimento, mas atinge principalmente os desenvolvidos.

O desenvolvimento tecnológico e a alta competitividade dos mercados apontam que este quadro não tende sofrer alterações a favor do trabalhador. Nas organizações, o otimismo da década de 1980 cede lugar às pressões e o nível de insatisfação entre os profissionais aumenta. É em torno dessa nova realidade no mundo das organizações que se deve analisá-las.