Unidade 2 Módulo 1
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1. Anatomia das crises financeiras (a teoria de Hyman Minsky)

A existência de escândalos corporativos não é assunto recente na história, conforme será observado em nosso estudo. Na verdade, há registros de bolhas especulativas já no século XVII!

Evidentemente, um acontecimento tão antigo já foi suficientemente estudado, existindo até teorias que classificam o fenômeno, explicando suas origens, desenvolvimento e desenlace, de forma pormenorizada e metodologicamente firmada.

O que existe, então, de novo? A novidade é o ressurgimento de um movimento regulatório de características globais, com o fim de regular o funcionamento dos mercados de forma mais segura, mitigando os riscos naturais que nele existem.

Para compreender melhor como tudo isso se processa, observemos, em seguida, um processo de análise das denominadas “crises financeiras”.




Uma bolha especulativa ocorre quando os preços dos ativos negociados em um dado mercado sofrem uma forte valorização ou desvalorização sem que tal movimento reflita, de forma razoável, o “valor justo” desses ativos. Ou seja, as bolhas especulativas envolvem, em maior ou menor grau, um movimento artificial de preços.




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Como observado por Kindleberger, é difícil que haja, na literatura econômica, um assunto mais convencional do que crises financeiras. O tema encontra maior atenção nos momentos em que elas causam prejuízos no mercado, e já existe vasta literatura associada ao seu estudo.

Essa literatura apresenta uma diferenciação básica entre a análise metodológica de historiadores e a dos economistas: para os primeiros, cada evento é único; para os economistas, entretanto, as forças que atuam nas sociedades e na natureza comportam-se em conformidade a padrões que podem ser estudados e compreendidos. Existem modelos que estudam os ciclos econômicos e as crises a eles associadas:

Para os fins do presente estudo, e seguindo Kindleberger, é apresentado o modelo de Hyman Minsky, que embora fosse um teórico do monetarismo e não um historiador econômico, é autor de uma teoria que se ajusta perfeitamente à interpretação da história econômica e financeira, a despeito de críticas apresentadas quanto a sua opinião sobre a fragilidade dos sistemas monetários existentes.

Minsky enfatiza a instabilidade dos instrumentos de crédito como de grande importância para o início de uma crise. As estruturas de débito das organizações acabariam por causar dificuldades financeiras, especialmente quanto às dívidas contraídas para financiar aquisições de ativos com objetivos unicamente especulativos, visando à obtenção de ganhos financeiros em posterior revenda.



ciclo Kitchin
O ciclo Kitchin associa flutuações de balanços empresariais a ciclos de 39 meses.




ciclo Juglar
O ciclo Juglar relaciona investimentos empresariais e seus resultados em ciclos de sete ou oito anos.




ciclo Kuznets
O ciclo Kuznets, de vinte anos, vincula variações populacionais à construção de habitações.




ciclo Kondratieff
O ciclo Kondratieff estuda alterações econômicas desencadeadas por grandes inovações como a estrada de ferro e o automóvel.




Kindleberger

KINDLEBERGER, Charles Poor. Manias, Pânico e Crashes: Um histórico das crises financeiras. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. p. 287



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Essa instabilidade dos instrumentos de crédito é potencializada por um choque “exógeno”, uma variável que surge em decorrência de um fato qualquer externo ao sistema macroeconômico e que sobre ele atua de forma a desordenar a ação dos agentes econômicos.

Esse fato, suficientemente amplo e difundido, modifica o cenário econômico, alterando percepções de valor e, em consequência, tende a desordenar o sistema de alocação de recursos em um ou mais setores da economia. Abrem-se oportunidades de lucro na aquisição de alguns ativos, fechando-se em outras. Diante desse novo cenário, indivíduos e empresas com recursos próprios ou acesso a crédito buscam posicionar-se melhor, aproximando-se de posições lucrativas e afastando-se daquelas percebidas como negativas, de forma a maximizar seus resultados.

Se as alterações vantajosas sobrepõem-se às desvantajosas, ocorre um “boom”, um movimento crescente daqueles agentes no sentido de se colocarem em posições vantajosas de lucro. Observe o que acontece:




Exógeno

Esse fato “exógeno” pode ser o início ou fim de uma guerra; uma ótima safra agrícola ou uma má colheita; a adoção em larga escala de uma inovação tecnológica (ferrovia, automóvel); uma grande mudança política ou financeira (mudanças das taxas de câmbio ou de juros, por exemplo).



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Tal percepção dos agentes transforma-se, em um primeiro momento, em profecia autorrealizada, pois a demanda pelo ativo aumenta exponencialmente, e o seu preço também. Isso ocorre como consequência primária do movimento especulativo estabelecido. A possibilidade de ganhos na especulação e os lucros decorrentes do aumento geral de preços conduzem a uma denominada “euforia” dos mercados.

As oportunidades de ganhos extraordinários atraem empresas e indivíduos, normalmente avessos a grandes riscos e normalmente ausentes do mercado, para tal movimento especulativo, o qual se transforma em uma “mania”, a formar uma “bolha”, atraindo parcelas consideráveis da população.


O movimento econômico inicia-se pela aquisição de ativos reais, mas quando transformado em mania coletiva, acaba por adquirir uma dinâmica em que esse vínculo aquisição/ativo real esmaece.

A especulação dissocia-se de objetos verdadeiros e passa a encontrar-se relacionada a itens virtuais, sem que os investidores – especialmente os que não se encontram acostumados aos mecanismos do mercado financeiro – compreendam os processos envolvidos. Tal desconhecimento abre a possibilidade da ocorrência de fraudes, e da eclosão dos posteriores escândalos.

À medida que o ciclo especulativo evolui, as taxas de juros e a velocidade das trocas de ativos aumentam. Em algum momento, profissionais de mercado resolvem vender seus ativos, a fim de embolsar lucros. Tal movimento acaba por causar instabilidade nos preços e apreensão por parte de potenciais candidatos a entrar no mercado.



Mania

Como apontado por Kindleberger, esse movimento pode ser denominado “mania” por se encontrar caracterizado como uma ação dotada de irracionalidade, “bolha” como prenúncio de um estouro que se aproxima.



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A instabilidade nos preços, causada pela especulação, assusta os menos experientes, que colocam rapidamente em dúvida a solidez de suas aplicações e inicia-se um processo geral de tomada de consciência de que os preços não mais podem subir. Esse momento, muito rápido, põe em risco a higidez patrimonial de vários agentes, principalmente daqueles que possuem grandes volumes de ativos sustentados por empréstimos bancários.

É a hora da retirada. A pressa em vender os ativos e transformá-los em ativos reais de extrema liquidez (moeda, depósitos bancários e metais nobres) torna-se uma correria coletiva, formando algo como um estouro de boiada. A corrida deixa em seu desenvolvimento a queda geral dos preços, a falência de várias empresas, indivíduos e, em seguida, de bancos, ameaçando a macroestrutura econômica de um país, e nos tempos atuais, por força da integração globalizante, a de todo o planeta. O pânico se estabelece.

Essa dinâmica não é moderna, Kindleberger, em seu livro “Manias, Pânico e Crashes”, indica que movimentos especulativos, e posteriores crises, já eram registrados no século XVII, tornando-se mesmo cíclicos no século XIX. Como já registrado, apesar de irracionais sob certo ponto de vista, são previsíveis. Também previsíveis são as fraudes, que acabam por formar escândalos, como apresentaremos a seguir.



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2. Escândalos corporativos

Como descrito por Candeloro, fraudes e escândalos começam por uma mentira. Não qualquer mentira, não a “mentira social” que, por vezes é contada para se evitar um constrangimento momentâneo, seja para proteger a si mesmo ou outrem de algum choque, de alguma mágoa. A mentira apontada pela autora é aquela conscientemente contada, articulada e estrategicamente planejada como parte de um plano maior, cujo objetivo é omitir um fato, alterar a percepção de um agente econômico quanto ao conteúdo de algum evento de natureza negocial.


Essa mentira, dessa forma instrumentalizada com a intenção de obter vantagem competitiva, a partir do momento que causa um prejuízo a outrem, a um terceiro que age de boa-fé, movido pelo erro induzido pelo convencimento do mentiroso, mediante a utilização de documentos e informações alteradas, entre outras condutas, configura a fraude.

Outro aspecto de suma importância para gestores que lidam com o mundo das finanças é o destacado pela mesma autora ao registrar a opinião expressa pela revista britânica The Economist, a qual destaca o fato de que grandes erros no mundo das finanças vêm sendo cometidos em consequência da adoção de “um conjunto de ideias surgidas no pensamento acadêmico nos últimos 30 anos”.


O problema central é que tais ideias vêm sendo adotadas como verdades absolutas, conduzindo agentes econômicos a atuar como se o mundo dos negócios funcionasse como uma ciência exata, a exemplo da física.

Ideias tais como o individualismo metodológico, que assume que todas as pessoas agem de forma a maximizar resultados, destituídos de valores como transparência e credibilidade, conduziram ao surgimento de falhas éticas que tornam o ambiente mais propício a atitudes limítrofes e ao surgimento de escândalos financeiros.

Ainda na obra de Candeloro, em interessante seção denominada “Baú de Histórias”, vão sendo descritos diversos casos de manias, bolhas e escândalos que têm se sucedido na história das finanças, os quais serão aqui resumidos e apresentados.



Cadeloro

CANDELORO, Ana Paula P. DE RIZZO, Maria Balbina M. e PINHO, Vinícius. Compliance 360°: riscos estratégias, conflitos e vaidades no mundo corporativo. São Paulo: Trevisan Ed. Universitária, 2012. p.359.



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1636-1637 - A Mania das Tulipas – Holanda

No primeiro desses casos, denominado “Mania das Tulipas”, é apresentada uma crise financeira ocorrida entre os anos de 1636 e 1637 na Holanda, logo após o sucesso batavo na Guerra Hispano-holandesa. Já àquela época, a produção de tulipas era uma forte atividade econômica entre os holandeses, pois aquelas flores eram muito apreciadas, gerando uma forte demanda e contínuo aumento em seus preços de aquisição. Tornou-se símbolo de status social possuir flores de tonalidades diferentes e exóticas, prestando-se a motivo de cobiça e objeto de competição entre famílias endinheiradas.

Os preços subiram vertiginosamente e, por volta de 1630, comerciantes passaram a vender os bulbos e não mais as flores, chegando-se a ponto de serem vendidos bulbos que viriam a surgir de plantas que ainda não haviam sido plantadas! De fato, eram vendidos os direitos de propriedade de bulbos que ainda não existiam, autênticos contratos futuros de bulbos de tulipas. Bens móveis e imóveis eram trocados por bulbos, havendo registro da venda de um único bulbo, em contrato, vendido ao preço equivalente a 24 toneladas de trigo.

Esse movimento, conforme descrito no modelo, chegou ao ponto de saturação. Comerciantes perceberam que não mais era possível inflacionar o mercado, e passaram a vender seus ativos, seguidos pela percepção coletiva da irracionalidade das ações existentes, instalando-se o pânico. Essa “bolha” especulativa acabou por levar à falência diversas pessoas que haviam especulado com flores e bulbos.

Assista no vídeo abaixo como ocorreu o episódio das Tulipas.



Bulbos são estruturas de plantas que, de forma semelhante às raízes, armazenam nutrientes. No caso das tulipas, são utilizados como sementes para o surgimento de novas plantas.




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1792 – William Duer – Estados Unidos

Um segundo caso, de notável destaque por ter sido a primeira grande crise registrada em Wall Street envolve a figura de William Duer. Cidadão britânico que alcançou relevo social em Nova York a partir de 1773, chegando a ocupar uma cadeira no Congresso Continental (primeiro governo autóctone dos Estados Unidos) e Secretário do Conselho de Administração do Tesouro, indicado por Alexander Hamilton (primeiro secretário do Tesouro dos Estados Unidos).

Tal posição permitia a Duer ter conhecimento do funcionamento das finanças do governo norte-americano. Contudo, ao saber que por participar do governo lhe seria proibido especular com títulos públicos, pediu demissão. Libertado da regra inconveniente, passou a utilizar dos conhecimentos adquiridos para especular, por meio de recursos emprestados junto a bancos e amigos endinheirados, realizando negócios de vulto e obtendo grandes lucros. Atraídos pela “expertise” do britânico, muitas pessoas lhe emprestavam recursos na esperança de receber polpudos ganhos sob a forma de juros.

Contudo, inconformada, uma rica família (Livingston) encontrava-se interessada em baixar os preços e atuou no sentido de aumentar as taxas de juros, por meio da retirada de seus vastos recursos depositados nos bancos, forçando aos bancos aumentar a demanda por moeda no mercado. Tal movimento acabou por levar Duer à falência, levando consigo muitos dos seus credores, banqueiros e corretores, causando um pânico no sistema financeiro norte-americano que surgia. Como consequência foi promulgada uma lei que conduziu à criação da Bolsa de Valores de Nova York.



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1920 – Esquema Ponzi – Estados Unidos

Um terceiro caso, cuja configuração encontra-se replicada em fenômenos recentes, obteve destaque, originalmente, em 1920 nos Estados Unidos, embora não se possa dizer ter sido criada naquele momento. Passou a ser conhecida pelo nome do seu autor, sendo sinônimo, no Brasil, de esquema de pirâmide: o esquema de Ponzi, ou esquema Ponzi.

A fraude surgiu do fato de Ponzi ter descoberto, graças à correspondência que recebia da Espanha, que os selos de resposta de correio internacional podiam ser vendidos, nos Estados Unidos, por valores mais altos do que no estrangeiro, existindo uma oportunidade de lucros. Começou por convencer amigos e parceiros a investir em seu negócio, acabando por atrair – com promessas de vultosos ganhos os quais foram corretamente pagos para os primeiros investidores – numerosos candidatos a investidores.

Contudo, Ponzi não comprava selos para revenda: simplesmente pagava os rendimentos devidos aos investidores por intermédio da obtenção de novos empréstimos. Saiba +

No dia 26 de julho de 1920 seu esquema começou a ruir. Um pequeno banco colocou em dúvida a lisura de suas ações, e o governo interveio, proibindo a sua empresa de contrair novos empréstimos. Em agosto de 1920, bancos declararam a falência de Ponzi, que veio a ser preso, tendo confessado ter participado, em 1908, de fraude semelhante no Canadá. Apesar de preso, pagou fiança e voltou para a Itália, deixando numerosos investidores sem obter o retorno esperado.



O esquema Ponzi coloca em destaque um cidadão italiano Carlo Ponce (Charles Ponzi na forma americanizada), o qual tornou popular a fraude pela dimensão que seus atos alcançaram.



Graças a esse esquema, Ponzi alcançou uma vida plena de luxos: comprou uma mansão, com ar condicionado e piscina e trouxe sua mãe, da Itália, em uma viagem de primeira classe, entre outras extravagâncias para si e família.
Veja mais sobre o esquema Ponzi em http://www.youtube.com/watch?v=MW5aDmQLqVY (até 4min)



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1995 – Barings Bank - Inglaterra

Um caso de escândalo financeiro que traz, em seu bojo, importantes lições para profissionais de compliance encontra-se na derrocada do Barings Bank. Banco Ingles bicentenário, fundado em Londres no ano de 1762, alcançou seu ocaso em 1995 pelos atos de um único de seus funcionários, agindo de forma isolada.

Nicholas Leeson foi funcionário desse banco, tendo assumido em 1992 o cargo de operador de mercados futuros na bolsa de valores de Cingapura, obtendo inicialmente grande sucesso, sendo responsável por representativa parcela dos lucros do Banco no ano de 1994.

Esses resultados acabaram por lhe conceder grande credibilidade, acabando por acumular as funções de gerência e de operações – funções normalmente desempenhadas por pelo menos duas pessoas, a gerência exercendo o papel de supervisão – sem qualquer limite operacional.

Sem adequada supervisão, Leeson começou, a partir do dia 16 de janeiro de 1995, a realizar uma série de operações extremamente prejudiciais. O resultado do prejuízo foi calculado em cerca de 1,4 bilhão de dólares, dilapidando o patrimônio do banco e conduzindo-o à insolvência no dia 26 de fevereiro com a perda absoluta de todo o patrimônio dos acionistas, e a consequente venda, pelo valor simbólico de £ 1 (uma libra esterlina).

Saiba +



Acerca desse assunto, assista a um filme interessante (The Rogue Trader – tradução livre “Comerciante Desonesto”), cujo trailer (em inglês) pode ser encontrado em http://www.youtube.com/watch?v=vgqSVVLFmds.



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2001 – Enron Corporation – Estados Unidos

Fundada em 1984 por Kenneth Lay, a Enron alcançou o status, ao final dos anos 90 do século passado, de empresa símbolo de modernidade e inovação. Destacava-se nas áreas de distribuição de energia e de comunicações, tendo alcançado um faturamento da ordem de US$ 101 bilhões no ano de 2000, pouco antes de sua falência.

Alguns analistas consideram que a fraude da empresa ter-se-ia iniciado em 1992, quando seu presidente convenceu fiscais federais a conceder à empresa o direito de utilizar um método conhecido como “marcação a mercado” para reconhecer como valores presentes, em balanço, resultados que só viriam a ocorrer no futuro.

Com base em valores que só existiam no balanço, e não no mundo real (em uma das técnicas que passaram a compor a assim denominada “contabilidade criativa”), a empresa obtinha margem para contrair empréstimos e adquirir no mercado outras empresas, ou mesmo se utilizar desse valor patrimonial fictício como lastro para emissão de ações e dá-las em pagamento para adquirir outras empresas.

Em decorrência de tais manobras, a Enron adquiriu um papel de protagonista nos mercados em que atuava, o que se refletia em consecutivas altas nos preços das ações, pois não se percebiam erros em seus balanços, embora ninguém compreendesse a origem dos resultados ali estampados.

Diante de uma crise na área das comunicações, analistas financeiros buscaram responder a essa questão, investigando de forma mais aprofundada a origem das receitas da empresa. Essa investigação, contudo, tornou-se inconclusiva, pois a estrutura de governança da empresa era de tal forma complicada que não se conseguia determinar o que era feito, e se havia regularidade nas contas.



Marcação a mercado significa trazer para valor presente um valor qualquer. Assim, um valor futuro, para ser calculado para o valor presente, deve ter esse valor futuro dividido por uma taxa de desconto (normalmente a taxa corrente de juros adicionada de uma taxa de risco).




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O fato é que as ações da empresa perderam fôlego, e os balanços da empresa, inflados que eram com as perspectivas otimistas de resultados da própria empresa, acabaram por refletir uma percepção mais acanhada.

Em outubro de 2001 anunciaram-se perdas da ordem de US$ 618 milhões, o que deu início a uma corrida de vendas das ações que conduziram a uma queda vertiginosa, a se iniciar por preço inicial de US$ 86,00 por ação até US$ 0,30. Essa queda, unida às desconfianças existentes, levou o órgão controlador norte-americano a efetuar investigação nos procedimentos contábeis da empresa, que veio a constatar a existência de fraudes contábeis e fiscais, impondo à empresa admitir ter inflado lucros e omitido dívidas em suas demonstrações contábeis.

Um efeito colateral dessa derrocada, além da perda absoluta dos valores investidos por acionistas e empregados, foi a dissolução da Artur Andersen (uma das então mais prestigiosas empresas de auditoria contábil do mundo) e a condenação judicial, e consequente prisão, de dirigentes envolvidos nas fraudes.

Saiba +



Acerca desse assunto, assista a um filme interessante - The Smartes guys in the room – tradução livre “Os mais espertos da sala” - cujo trailer (em inglês) pode ser visto em http://www.youtube.com/watch?v=mRvI6d5cbeQ



Tela 13
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2008 – Crise do setor imobiliário – Estados Unidos

No ano de 2001, em meio a uma grande crise nas empresas de alta tecnologia (as empresas “pontocom”), o banco central norte-americano (o Federal Reserve) diminuiu a taxa de juros de referência, com a intenção de incentivar o consumo e afastar do horizonte a possibilidade que a crise até então localizada se espalhasse para outros setores da economia. Esse objetivo foi alcançado, com efeitos outros, entretanto, inesperados. Um efeito inesperado foi a movimentação que surgiu no sentido da aquisição de imóveis em altos volumes, de forma a aproveitar-se das baixas taxas de juros que passaram a vigorar.

A partir de 2005 ocorreu de fato um boom imobiliário. Comprar casas tornou-se um bom negócio não apenas para as incorporadoras e bancos, mas também para os adquirentes, que passaram a testemunhar o rápido crescimento dos valores desses ativos.

As companhias hipotecárias começaram a investir em um novo nicho comercial: o “subprime”. Os chamados clientes “subprime” são clientes de menor renda (ou mesmo sem renda comprovada), geralmente inadimplentes que, devido às suas dificuldades cadastrais, encontravam-se dispostos a contrair empréstimos por taxas mais elevadas. Devido a esse maior risco, aquelas companhias calcularam a possibilidade de obter maiores lucros ainda mais quando passaram a emitir títulos de crédito tendo por sustentação as receitas futuras dos empréstimos concedidos a esse tipo de cliente.

Gestores de fundos de investimento, desejosos de também obter maiores ganhos para as suas carteiras compravam esses títulos, antes mesmo que a primeira prestação do empréstimo fosse paga. Em sequência, esses títulos começaram a ser negociados, alguns compradores efetivamente não sabendo que tipo de negociação havia dado origem ao título comprado.

Em 2006, devido a toda essa movimentação, os imóveis encontravam-se muito valorizados, alcançando um pico em suas cotações e, então, começaram a cair rapidamente. Saiba +



Os juros, que haviam entrado em trajetória de aumento a partir de meados de 2004, encareceram os financiamentos, aumentando a inadimplência, prejudicando o recebimento dos valores daqueles títulos anteriormente negociados. Estabeleceu-se, ainda, um desequilíbrio entre oferta e procura: muitos imóveis novos não encontravam mais compradores (imóveis muito caros a juros altos), imóveis usados, recuperados pelas companhias hipotecárias de clientes inadimplentes, também não.



Tela 14
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Diante dessa crise (o mercado de construção civil é o mais representativo na economia doméstica americana), a economia enfraqueceu de forma sistêmica, grandes conglomerados econômicos dos setores imobiliário e bancário perderam bilhões de dólares. Estabeleceu-se, mais uma vez, o pânico.

Diante do pânico estabelecido, e às vésperas de uma eleição presidencial que levou Barack Obama à Casa Branca, estabeleceu-se um acordo para a emissão de centenas de bilhões de dólares em moeda para a compra dos “títulos podres” (papéis de improvável resgate). Tal situação financeira, de dimensões gigantescas, lançou o planeta em uma grande crise, cujos ecos ainda são percebidos com a crise das economias europeias.

Veja como começou a crise:

Saiba mais sobre o fenômeno da bolha imobiliária.




Vários grandes conglomerados vieram a pedir concordata, ou mesmo faliram simplesmente. O Banco Lehman Brothers pediu concordata; o Merryll Lynch foi vendido; bilhões de dólares reunidos às pressas em forma de empréstimo salvaram a AIG; o Washington Mutual quebrou; e houve a venda do Banco Wachovia para o Wells Fargo.



Tela 15
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Arthur Andersen

Como bem registrado por Da Silva, a Arthur Andersen era uma das cinco maiores empresas do setor de auditoria, tendo fechado suas portas no dia 30 de agosto de 2002, na esteira da crise iniciada pela Enron. A empresa, por intermédio de decisões de seu corpo de auditores, descuidou de uma maior disciplina nos registros contábeis daquela empresa, aumentando os limites onde transitava suas demonstrações. Essa decisão teve como objetivo o de manter seu segundo maior cliente, fruto de grandes recursos financeiros para a Andersen.

Essas ações, em favor da adoção de uma “contabilidade criativa”, mostraram-se claramente inadequadas ao restar comprovado que a empresa de auditoria foi responsável pela decisão de destruir documentos comprometedores ao saber do interesse de autoridades federais em lê-los.

A Andersen foi condenada, na justiça americana a cinco anos de prisão (sentença máxima no ordenamento jurídico americano para o crime de que era acusada), além de multa de US$ 500 mil, por obstrução à justiça. Tal condenação revestiu-se de caráter simbólico, pois a empresa já havia cessado suas atividades em agosto de 2002.

O destino da Arthur Andersen conduziu a uma profunda revisão dos procedimentos de auditoria norte-americanos, bem como de seu arcabouço legal naquela naçãom, com efeitos em todo o planeta.



DA SILVA, Edson Cordeiro. Governança corporativa nas empresas: guia prático de orientação para acionistas, investidores, conselheiros de administração, executivos, gestores, analistas de mercado e pesquisadores. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. P. 189.



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2008 - O caso Madoff

Bernard Madoff foi um grande financista norte-americano. Fundou, em 1960, uma empresa de investimentos em Wall Street, que se tornou uma das mais importantes do mercado. Figura destacada da sociedade judaica novaiorquina angariou respeitabilidade e credibilidade ímpares junto a essa comunidade, chegando a ser presidente da NASDAQ.

Esse destaque acabou por lhe granjear facilidades junto a entidades governamentais, bancárias e grupos de investimento – até mesmo fundações e organizações caritativas - que oportunizaram a aplicação de uma sofisticada forma de “esquema Ponzi”, e lhe valeram uma condenação, no dia 29 de junho de 2009, a 150 anos de prisão por 11 diferentes crimes (sentença máxima permitida pela legislação para o caso).

Essa figura de destaque oferecia uma oportunidade de investimento que renderia, mensalmente, 1%. Em um contexto de taxa de juros, anual, da mesma ordem (1% a.a.), era um investimento completamente desarrazoado, de rendimento muito alto, o que só era possível, provisoriamente, por intermédio da entrada de novos investidores, a alimentar os rendimentos dos anteriores.

A eclosão da crise financeira, já em 2007, começou a prejudicar o esquema, que não foi capaz de atrair novos participantes, deixando de haver o pagamento dos investidores, impedindo-os de resgatar seus depósitos.

Há estimativas de que a fraude teria chegado ao montante de US$ 65 bilhões, colocando-a entre as maiores fraudes da história, perpretada por uma figura do maior relevo do maior centro financeiro mundial.



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3. Forças regulatórias

Os exemplos apresentados neste módulo permitem que seja percebida a quantidade de riscos existentes no mercado financeiro advindas de fraudes as mais diversas. Vimos, também, que tais fenômenos já vêm ocorrendo há centenas de anos.

Como reação a tais crises, forças regulatórias, voltadas para o aperfeiçoamento dos mecanismos de controle dos riscos existentes, bem como à prevenção e repressão das fraudes têm agido.

Apresentaremos, a seguir, algumas das providências tomadas nesse sentido, as quais serão vistas com detalhes mais adiante.

  • Criação do BIS - Bank for International Settlements;
  • Primeiro Acordo da Basileia;
  • Novo Acordo da Basileia;
  • Lei Sarbanes-Oxley.


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A criação do BIS

A criação, em 17 de maio de 1930, do Banco de Compensações Internacionais (em inglês: Bank for International Settlements – BIS), que é a mais antiga organização financeira internacional foi um dos indicadores das ações estabilizadoras. Já em sua missão institucional fica destacado o objetivo de se promover a estabilidade financeira e monetária, o que se reflete, a propósito, na criação de um Instituto em cujo nome (Financial Stability Institute – FSI) fica estabelecido esse compromisso.

A estrutura do BIS é composta por diversos comitês, que estudam diversos temas. Um dos mais conhecidos é o Comitê de Supervisão Bancária da Basileia, que foi criado em 1974 com o nome de Comitê para Regulação Bancária e Práticas de Supervisão.

Esse Comitê, embora não disponha de autoridade de supervisão, emite padrões mínimos de supervisão da atividade financeira, recomendando as melhores práticas. No Brasil, o Banco Central é o supervisor do Sistema Financeiro Nacional e tem emitido atos normativos que replicam, no mercado interno, os príncipios e doutrinas daquele Comitê. Tal postura busca não um alinhamento a ideias estruturadas além-fronteiras, mas acima de tudo busca a estabilidade do sistema financeiro doméstico, tornando-o apto a fazer face à competitividade existente em um setor econômico cada vez mais globalizado.



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O primeiro Acordo da Basileia

A perseguição do objetivo de estabilidade financeira conduziu a discussões de padrões internacionais comuns para a indústria bancária, os quais acabaram por serem consolidadas no International convergence of capital measurement and capital standards – July 1988 (Convergência Internacional de medidas de capital e padrões de Capital – Julho 1988, em tradução livre), os quais foram firmados pelos representantes de dez bancos centrais, em 15 de julho de 1988.

Esse documento, que passou a ser conhecido como Acordo de Basileia de 1988, focou a necessidade das instituições financeiras manterem capital em volume suficiente ao nível de risco envolvido em suas atividades, de forma a garantir requisitos de capital suficiente à “cobertura” de perdas inesperadas em todas as ocorrências, de forma a manter a estabilidade do sistema, minimizando custos à sociedade.

Em 1996 houve a publicação de uma atualização ao Acordo, incorporando requisitos mínimos de capital para exposição a riscos de mercado, e a permissão para adoção de modelos internos para o cálculo dos níveis mínimos.




O texto completo do Acordo da Basileia, no original em inglês, pode ser lido em http://www.bis.org/publ/bcbs04a.pdf, visitado em 26/11/2012.



Texto original da atualização do Acordo, em inglês, disponível em http://www.bis.org/publ/bcbs119.pdf, visitado em 26/11/2012.



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O Novo Acordo da Basileia

A eclosão de diversas crises financeiras na última década do século passado conduziu ao aperfeiçoamento do Acordo de Basileia, pois se constatou que a evolução dos mercados financeiros exigia, para que fosse assegurado um nível adequado de estabilidade, o desenvolvimento de novas formas de avaliação e gestão dos riscos, de forma a se alcançar melhores práticas na organização e funcionamento dos mercados.

Esse novo Acordo incorpora requisitos mais rigorosos na análise do perfil de risco assumido por cada uma das instituições financeiras, visando a fortalecer a estabilidade do sistema bancário internacional, concedendo, aos supervisores de atividade bancária ao redor do globo uma base conceitual a ser levada em conta em seu disciplinamento doméstico. Conceitualmente, como registrado no próprio site do BIS esse novo referencial encontra-se sustentado em tres pilares, que compõem a segunda, terceira e quarta parte do documento, como podemos ver na imagem abaixo:

Particularmente no Brasil, como já registrado, o Banco Central tem utilizado sobremaneira as recomendações do BIS na emissão de suas normas de supervisão do Sistema Financeiro Nacional, o que pode ser comprovado observando o site do Banco. Saiba +



O texto do novo Acordo da Basileia está disponível em http://www.bis.org/publ/bcbs118.pdf (Atualizado em 11/2005), visitado em 26/11/2012.



http://www.bis.org/publ/bcbs118.htm, visitado em 26/11/2012.



Particularmente, sobre esse assunto, recomenda-se a leitura do documento “Princípios Fundamentais para uma Supervisão Bancária Efetiva”, o qual traz uma tradução livre da obra “Core Principles for Effective Banking Supervision”. Texto na íntegra disponível em http://www.bcb.gov.br/fis/supervisao/docs/CorePrinciplesTraducao2006.pdf



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A Lei Sarbanes-Oxley

A despeito do esforço regulatório liderado pelo BIS, os Estados Unidos mantiveram-se, por muito tempo, leais ao seu ideal de livre-empresa na defesa dos direitos individuais e liberdade econômica. Contudo, após repetidos escândalos tais como os perpretados pela Enron, Arthur Andersen, WorldCom e outras empresas, foi promulgada em 30 de julho de 2002 a Lei Sarbanes-Oxley (também denominada SOX).

Essa lei foi criada com a intenção de deter a então crescente desconfiança dos investidores dos mercados financeiros quanto à qualidade da segurança de seus investimentos e da solidez dos princípios de governança adotados pelas empresas norte-americanas.

Emitida para ser adotada pela maior economia do planeta, o caráter globalizado da economia acabou por espalhar seus efeitos para além das fronteiras daquele País. Qualquer empresa que opere naquele mercado, emitindo títulos de crédito ou atuando como agente financeiro, assim como subsidiárias de empresas americanas distribuídas em outros países, encontram-se subordinadas aos seus ditames.

De particular destaque entre suas orientações é a atenção dedicada ao sistema de controles internos das organizações empresariais e às boas práticas de governança. Outro aspecto é o processo de responsabilização pessoal dos agentes envolvidos, particularmente a dos Diretores-presidentes e Diretores-financeiros quanto às informações expressas nos demonstrativos financeiros, bem como a alta administração das companhias na adoção de procedimentos efetivos de controle interno, e demais providências que assegurem transparência na emissão e divulgação de informações financeiras relevantes ao mercado.

Atenção, também, foi dada ao regramento da emissão de pareceres de auditoria independente quanto a sua opinião sobre o relatório anual da empresa e da efetividade de seus controles internos.



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Resumo

A atividade econômico-financeira possui uma história em que se observam, de forma recorrente, escândalos financeiros. Há também um esforço regulatório, a partir da primeira metade do século XX, na tentativa de assegurar estabilidade financeira e a adoção de procedimentos éticos.

Um modelo teórico que explica adequadamente o surgimento de crises e fraudes é o de Hyman Minsky, o qual enfatiza a instabilidade do crédito como de grande importância para o início de uma crise. Um choque “exógeno” altera percepções de valor e o sistema de alocação de recursos em um ou mais setores da economia. Se as alterações vantajosas sobrepõem-se às desvantajosas, ocorre um movimento crescente na busca de posições vantajosas. O movimento de busca de ativos induz aumento do crédito, potencializando a especulação. Os lucros decorrentes do aumento geral de preços conduzem a uma “euforia” dos mercados.

Iniciada pela aquisição de ativos reais, a especulação dissocia-se deles, possibilitando as fraudes. Estabelece-se a instabilidade nos preços e impõe-se a percepção de que os preços não mais podem subir. A venda de ativos torna-se uma correria coletiva, deixando em seu rastro a queda geral dos preços, a falência de empresas, indivíduos e bancos.

Escândalos corporativos - uma origem de escândalos é a mentira, instrumentalizada com a intenção de obter vantagem competitiva, configurando a fraude. Outra origem é a adoção de ideias surgidas no pensamento acadêmico e adotadas como verdades absolutas, como se o mundo dos negócios funcionasse como uma ciência exata.



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1636-1637 A Mania das Tulipas – Holanda

Crise financeira ocorrida entre os anos de 1636 e 1637 na Holanda, logo após o sucesso batavo na Guerra Hispano-holandesa. Tornou-se símbolo de status social possuir flores de tonalidades diferentes e exóticas, prestando-se a motivo de cobiça e objeto de competição entre famílias endinheiradas. Comerciantes venderam os bulbos e não mais as flores, autênticos contratos futuros de tulipas. Comerciantes perceberam que não era mais possível inflacionar o mercado, instalando-se o pânico, levando à falência diversas pessoas.

1792 – William Duer – Estados Unidos

Duer possuía grande conhecimento do funcionamento das finanças do governo norte-americano, especulando, por meio de recursos emprestados. Um aumento nas taxas de juros levou Duer à falência, levando consigo muitos dos seus credores, banqueiros e corretores.

1920 – Esquema Ponzi – Estados Unidos

Conhecida pelo nome do autor (Carlo Ponzi), sendo sinônimo, no Brasil, de “esquema de pirâmide”, surgiu do fato de Ponzi ter descoberto que os selos de resposta de correio internacional podiam ser vendidos, nos Estados Unidos, por valores mais altos do que no estrangeiro. Contudo, Ponzi não comprava selos para revenda: simplesmente pagava os rendimentos devidos aos investidores por intermédio da obtenção de novos empréstimos. Em agosto de 1920, bancos declararam Ponzi em bancarrota, deixando numerosos investidores sem obter o retorno esperado.

1995 – Barings Bank – Inglaterra

Sem adequada supervisão, Nicholas Leeson realizou uma série de operações danosas ao banco. O resultado do prejuízo foi calculado em cerca de 1,4 bilhão de dólares, dilapidando o patrimônio do banco e conduzindo-o à insolvência.



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2001 – Enron Corporation – Estados Unidos

A fraude da empresa ter-se-ia iniciado quando seu presidente convenceu fiscais federais a reconhecer como valores presentes, em balanço, resultados que só viriam a ocorrer no futuro.

Diante de uma crise na área das comunicações, os balanços da empresa, inflados que eram, acabaram por refletir uma percepção mais acanhada. O órgão controlador norte-americano efetuou investigação nos procedimentos contábeis da empresa, impondo à empresa admitir ter inflado lucros e omitido dívidas em suas demonstrações contábeis.

Um efeito colateral dessa derrocada foi a dissolução da Artur Andersen e a condenação judicial, e consequente prisão, de dirigentes envolvidos.

2008 – Crise do setor imobiliário – Estados Unidos

A partir de 2005 ocorreu um boom imobiliário nos Estados Unidos. As companhias hipotecárias começaram a investir em um novo nicho comercial: o “subprime”, clientes de menor renda, geralmente inadimplentes que se encontravam dispostos a contrair empréstimos por taxas mais elevadas. Gestores de fundos de investimento compraram títulos fundados nesses empréstimos.

Em 2006, estabeleceu-se um desequilíbrio entre oferta e procura: a oferta sobrepujou a demanda. A economia enfraqueceu de forma sistêmica, grandes conglomerados econômicos vieram a pedir concordata, ou mesmo falindo.

2008 - O caso Madoff

Bernard Madoff foi um grande financista norte-americano. Angariou respeitabilidade e credibilidade ímpares, granjeando facilidades junto a entidades governamentais, bancárias e grupos de investimento – até mesmo fundações e organizações caritativas - que oportunizaram a aplicação de uma sofisticada forma de “esquema Ponzi”.



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Forças regulatórias

O BIS - Banco de Compensações Internacionais foi criado em 1930 e é composto por diversos comitês, entre eles o Comitê de Supervisão Bancária da Basileia, criado em 1974.

Discussões de padrões internacionais comuns para a indústria bancária acabaram por serem consolidadas no International Convergence of Capital Measurement and Capital Standards – July 1988, que passou a ser conhecido como Acordo de Basileia de 1988. Foca a necessidade das instituições financeiras manterem capital em volume suficiente ao nível de risco envolvido em suas atividades.

O novo Acordo incorpora requisitos mais rigorosos na análise do risco assumido por cada uma das instituições financeiras, concedendo aos supervisores de atividade bancária ao redor do globo uma base conceitual sustentada em três pilares: requerimentos mínimos de capital; revisão do processo de supervisão e disciplina de mercado.

A Lei Sarbanes-Oxley (também denominada SOX) foi emitida para ser adotada pela maior economia do planeta, espalhando seus efeitos para além das fronteiras daquele País. Qualquer empresa que opere naquele mercado, emitindo títulos de crédito ou atuando como agente financeiro, assim como subsidiárias de empresas americanas distribuídas em outros países, encontra-se subordinada aos seus ditames. Foca o sistema de controles internos, boas práticas de governança, transparência, responsabilização pessoal dos agentes e a auditoria independente.



Unidade 2 Módulo 2
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1. Desvios éticos no contexto de compliance

Os desvios éticos e práticas criminosas alcançaram tal sofisticação e volume que se concluiu que, para seu combate efetivo, necessita-se de uma ação coordenada em nível internacional, reunindo ações de diversos países, seus sistemas financeiros e numerosas instituições de caráter global.

Mais efetivamente nos últimos anos, atentados terroristas de grande porte, cuja montagem e acionamento exigiu uma logística distribuída por diversos países (os atentados ao metrô de Londres em 07 de julho de 2005, bombas em um trem espanhol no dia 11 de março de 2004, além do mundialmente famoso ataque às torres gêmeas e ao Pentágono em 11 de setembro de 2001) trouxeram para o centro das considerações a necessidade de as autoridades das diversas nações atuarem objetivamente, de forma coordenada, no sentido de eliminarem as fontes de financiamento ao terrorismo.

É de se destacar que a Lei Nº 9.613, de 3 de março de 1998, já no caput do art. 1º, caracteriza o crime de lavagem de dinheiro não apenas como:


O fato de se possuir recursos cuja origem seja ilícita, mas também inclui como atos delituosos uma série de atos que conduzem a esse resultado final, os quais são conhecidos como “crimes antecedentes de lavagem de dinheiro”. Assim, ocultar ou dissimular a origem, a natureza, a localização, a disposição, movimentação, de forma direta ou indireta também compõem o ato delituoso, de infração penal.

A importância desses detalhes, para quem é responsável pelo setor de compliance de uma organização ou mesmo para seus administradores, consiste no fato de que, se não devidamente acompanhados e completamente seguidos princípios éticos e legais, a empresa – e seus agentes – poderão ser condenados legalmente, sendo os responsáveis passíveis de pena de reclusão de três a dez anos de multa.




O texto da Lei nº 9613 está disponível, na íntegra, como material complementar desta Unidade.



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Entretanto, um pequeno conflito encontra-se estabelecido. Faz parte da postura ética básica do mercado financeiro a manutenção da confidencialidade. Tal postura, naturalmente, abrange uma atitude de preservação do sigilo acerca da natureza das operações efetuadas, sobre a identidade dos parceiros (clientes, fornecedores, bancos, prestadores de serviços etc.) e do volume das operações ocorridas.

Esse dever de sigilo, esperado por parte dos operadores, encontra-se também ligado a exigências originadas em documentos legais, particularmente quanto ao que tange ao sigilo bancário. Como tal procedimento, no decorrer dos anos, veio a se tornar um instrumento utilizado por entidades interessadas no mau uso de recursos financeiros para encobrir a natureza de suas atividades (narcotráfico, corrupção, crime organizados e atividades terroristas), mitigou-se a adequabilidade da manutenção do sigilo nas movimentações financeiras, surgindo estudos para definir seus limites e atribuição de responsabilidades aos agentes do mercado.

Estudaremos, inicialmente, alguns desvios éticos observados no cenário econômico.



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2. Lavagem de Dinheiro

Em obra extremamente rica em exemplos reais (“100 Casos de Lavagem de Dinheiro: Grupo de Egmont – FIUs em Ação”), o Conselho de Atividades Financeiras (COAF) indica que:


Lavagem de dinheiro é o processo pelo qual o criminoso transforma recursos oriundos de atividades ilegais em ativos com origem aparentemente legal.

No processo de transformação de recursos ilegais em bens e valores que assumem uma aparência de terem uma origem legítima, diversas entidades intervêm. No mercado financeiro são efetuadas operações, múltiplas transações, “embaralhando” de tal forma o fluxo financeiro dos valores que permite que venham a ser utilizados pelos criminosos sem que seja percebida sua origem criminosa, a não ser que ocorra uma pormenorizada investigação.

Segundo ainda a obra citada, existem cinco tipos gerais de lavagem:

  • Ocultação dentro de estruturas empresariais;

  • Utilização indevida de empresas legítimas;

  • Uso de identidades ou documentos falsos e de “testas-de-ferro”;

  • Exploração de questões jurisdicionais internacionais;

  • Uso de ativos ao portador.

Veremos cada um desses tipos a seguir.

Lavagem de Dinheiro

VÍDEO



Texto disponível no site https://www.coaf.fazenda.gov.br/conteudo/publicacoes/downloads/100_Casos.pdf, acessível em em 27/12/2012.



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Clique para conhecer os tipos gerais de lavagem de dinheiro.
Utilização indevida de empresas legítimas
Uso de identidades ou documentos falsos e de “testas-de-ferro”
Exploração de questões jurisdicionais internacionais
Uso de ativos ao portador

 




A ocultação dentro de estruturas empresariais busca ocultar os recursos de origem criminosa dentro das atividades normais de empresas controladas por organização criminosa. Dessa forma, são “misturados” recursos de origem criminosa aos existentes de forma legítima, utilizando-se do fluxo financeiro existente. Trata-se da forma mais comum de lavagem de dinheiro.




A utilização indevida de empresas legítimas - é de especial interesse aos estudiosos de Compliance. O criminoso tenta utilizar uma empresa, legítima e que desconhece a origem criminosa dos recursos, para efetuar a lavagem dos recursos. Tal processo busca utilizar a imagem da empresa legítima, pois os recursos serão “enxergados” pelo mercado como tendo nela sua origem. O risco para a empresa inocente é que, ainda que venha a provar juridicamente sua boa-fé, permanecerá tendo sua imagem ligada à atividade criminosa efetuada. Com o aperfeiçoamento dos mecanismos de controle, este processo tem aumentado sua ocorrência, o que demanda atenção dos gestores.




Outra forma com que se busca iludir as autoridades fiscalizadoras é o uso de identidades ou outros documentos falsificados, ou mesmo o uso de “testas-de-ferro”. Esse instrumento foi desenvolvido como reação à capacidade desenvolvida no sentido de identificar e confiscar bens de indivíduos ou entidades associados a atividades criminosas. Assim, personagens inexistentes (criadas com documentação falsa), ou não associadas a essas atividades (“testas-de-ferro” ou também denominadas “laranjas”) são utilizadas com a intenção de, ainda que a movimentação financeira seja identificada, não seja ligada à atividade criminosa ou, ainda, no caso de prisão dos criminosos, os recursos não sejam localizados, podendo vir a ser utilizados após o cumprimento de penas de restrição de liberdade. Outro uso de documentos falsos ou “testas-de-ferro” é o de conceder ares de credibilidade a outros esquemas de fraude, de forma a comprovar esquemas criados para a lavagem de dinheiro. Faturas, recibos e documentos de viagem falsos já foram utilizados para encobrir recursos “lavados”.




A exploração de questões jurisdicionais internacionais aproveita-se da existência de diferentes jurisdições em todo o mundo, o que cria a oportunidade de se utilizar de diferenças de legislação no tocante a sigilo bancário, exigências de identificação, exigências de declaração, leis tributárias distintas, assim como exigências para constituição de empresas e restrições cambiais para a perpretação da lavagem do dinheiro. A falta de familiaridade com outras legislações, naturais dificuldades com a língua, restrições quanto ao acesso às informações, o alto custo de investigações no exterior e a lentidão do fluxo de informações entre sistemas jurídicos distintos auxiliam no sentido de aumentar as possibilidades de êxito desse tipo de esquema criminoso.




O uso de ativos ao portador (também denominado “uso de Ativos Anônimos”), é considerado sob alguns aspectos o mais simples. Dinheiro em espécie, bens de consumo de alto valor, jóias (diamantes, por exemplo), metais preciosos (ouro, prata e platina), alguns sistemas eletrônicos de pagamento e produtos financeiros (contas pessoais numeradas) permitem que grandes valores sejam movimentados de forma física, sem que permaneça evidenciada a propriedade. O uso de dinheiro em espécie, nesse tipo de esquema, normalmente é o mais comum.




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a) Fases da lavagem do dinheiro

Para bem ocultar os lucros obtidos de forma ilícita sem comprometer o(s) autor (es) dos crimes, a lavagem de dinheiro realiza-se por intermédio de um processo dinâmico onde são encontrados os seguintes elementos:



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Conforme enunciado pelo próprio Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), a lavagem de dinheiro ocorre em três fases distintas: colocação, ocultação e integração, como mostrado a seguir.

 



Objetivando ocultar sua origem, o criminoso procura movimentar o dinheiro em países com regras mais permissivas (nos assim denominados “paraísos fiscais”) e naqueles que possuem um sistema financeiro liberal. A colocação se efetua por meio de depósitos de dinheiro em espécie, compra de instrumentos negociáveis ou aquisição de bens. Para dificultar a identificação da procedência do dinheiro, os criminosos aplicam técnicas sofisticadas e cada vez mais dinâmicas, tais como o fracionamento dos valores que transitam pelo sistema financeiro e a utilização de estabelecimentos comerciais que usualmente trabalham com dinheiro em espécie.




O objetivo da ocultação é quebrar a cadeia de evidências ante a possibilidade da realização de investigações sobre a origem do dinheiro. Os criminosos buscam movimentá-lo de forma eletrônica, transferindo os ativos para contas anônimas – preferencialmente, em países amparados por lei de sigilo bancário – ou realizando depósitos em contas "fantasmas".




As organizações criminosas buscam investir em empreendimentos que facilitem suas atividades – podendo tais sociedades prestar serviços entre si. Uma vez formada a cadeia, torna-se cada vez mais fácil legitimar o dinheiro ilegal.




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b) Operações que são indícios de lavagem de dinheiro

Da experiência de fiscalização de órgãos internacionais, alguns indicadores de maior possibilidade de operações de lavagem de dinheiro são os que se seguem:




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Naturalmente, a preocupação do responsável pelo setor de compliance deve ser a de se antecipar aos problemas, e alguns outros indícios podem e devem ser examinados com maior atenção sempre que forem observados em sua área de atuação:

I. Aumentos substanciais no volume de depósitos em alguma das contas da organização, sem causa aparente. Tais eventos são motivo de ainda maior atenção se encontrarem-se associados a rápidas transferências, em curto intervalo de tempo, para partes anteriormente não relacionadas com a empresa;

II. Grandes movimentações financeiras envolvendo operações cambiais (troca de moeda nacional por estrangeira ou vice-versa);

III. Compras de cheques de viagem e administrativos, ordens de pagamento ou outros instrumentos de pronto pagamento, cuja quantidade e objetivo não sejam suficientemente claros;

IV. Movimentações financeiras de vulto em cidades de fronteira;

V. Movimentação de recursos em montante incompatível com o patrimônio, atividade econômica, atividade profissional ou a capacidade financeira presumida de um cliente;

VI. Existência de numerosas contas para um mesmo cliente, em volumes significativos;

VII. Existência de contas bancárias – próprias ou de clientes – situadas em locais de trânsito, tais como estações de passageiros, aeroportos, portos ou rodoviárias, exceto em se tratando de cliente cuja atividade principal justifique tal ato; e

VIII. Utilização de cartões de crédito da empresa em volumes incompatíveis com o objetivo para o qual foram emitidos.

 



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3. Insider Trader

Como explicitado nos primeiros parágrafos deste módulo, a confidencialidade faz parte da postura esperada dos profissionais que atuam no mercado financeiro, assim como em todo o mundo dos negócios. O exercício de várias funções permite o acesso a informações relevantes, as quais são obtidas de forma especial, caracterizando estarem, esses agentes, em condições de acessar “informações privilegiadas”.

O acesso a essas informações cria oportunidades privilegiadas à tomada de decisões, pois aqueles agentes podem decidir com maior número de informações do que o usual para os agentes do mercado. Tal privilégio criou, naturalmente proibições do uso de tais informações por parte daqueles agentes. Agentes que desrespeitem tal postura ética, são denominados “Insider trader”.

Dessa forma, “Insider Trader” é o indivíduo que, tendo acesso a informações privilegiadas, as usa em benefício próprio ou para benefício de terceiros.



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4- Front runner

De forma semelhante ao item anterior, o “Front runner” envolve o desrespeito ético à confidencialidade, aplicada à relação com clientes.

Existem agentes que, no mundo financeiro, efetuam ordens de venda ou de aquisição de ativos para atendimento de clientes. O conhecimento de tais ordens de compra ou de venda, que é uma informação de caráter confidencial, é utilizado para obter proveito próprio ou para terceiros.

Assim, o Front Runner “corre” a frente da ordem do cliente, realizando antes, para si mesmo, a operação ordenada pelo cliente, de forma a obter um ganho em uma futura recompra ou venda, obtendo vantagem competitiva em relação a esse.

Também é considerado Front Runner o operador que, conhecedor do conteúdo de algum documento (relatório de análise de investimentos, ou de resultados de alguma empresa) de forma prévia à sua publicação, opera no mercado de forma a auferir lucros em antecipação à reação que o mercado apresentará ao conteúdo de tal documento.


Assim, o Front Runner “corre” a frente da ordem do cliente, realizando antes, para si mesmo, a operação ordenada pelo cliente, de forma a obter um ganho em uma futura recompra ou venda, obtendo vantagem competitiva em relação a esse.

Também é considerado Front Runner o operador que, conhecedor do conteúdo de algum documento (relatório de análise de investimentos, ou de resultados de alguma empresa) de forma prévia à sua publicação, opera no mercado de forma a auferir lucros em antecipação à reação que o mercado apresentará ao conteúdo de tal documento.



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5. Prevenção

5.1 Identificação de Clientes, análise do perfil do investidor

Uma das formas mais eficiente de prevenção ao envolvimento com processos criminosos que incorporem a instituição a um processo de lavagem de dinheiro é uma correta gestão da relação empresa/clientes.

Essa gestão deve incorporar:


• A manutenção de um cadastro atualizado de clientes, o qual inclua, entre outras informações, a identificação dos proprietários e representantes das empresas clientes.

• O registro das transações em moeda nacional ou estrangeira efetuadas com os clientes.

• A conservação desses cadastros e arquivos pelo prazo de 5 anos.

• O atendimento pronto e nos prazos solicitados a toda e qualquer requisição formulado pelo COAF.




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5.2 Comunicações ao BACEN

Mais especificamente direcionada para as instituições financeiras, existe no Brasil a obrigação de comunicação ao Banco Central das seguintes situações:


• Qualquer operação financeira suspeita que envolva bens ou valores acima de R$ 10.000,00;

• Quaisquer operações financeiras suspeitas, efetuadas em um mesmo mês de calendário, que superem o montante de R$ 10.000,00; e

• Qualquer depósito, retirada ou pedido de provisionamento para saque, de valor igual ou superior a R$ 100.000,00, de qualquer natureza, independentemente da existência ou não de circunstâncias que levantem suspeitas.

5.3 O Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF

Resultado do aperfeiçoamento das ferramentas de controle do mercado brasileiro, foi criado o Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Unidade de Inteligência Financeira do Sistema Financeiro Nacional para a prevenção de Lavagem de Dinheiro e crimes conexos.

Entre suas atribuições, encontra-se “disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas…”.

No exercício de suas funções, o COAF deverá propor mecanismos de cooperação e troca de informações com órgãos congêneres no exterior, podendo, ainda, requerer informações bancárias e financeiras a órgãos de administração pública de pessoas envolvidas em atividades suspeitas.

 



Atribuições determinadas pelo Art. 17 da Lei 9.613 - Dos Crimes de "Lavagem" ou Ocultação de Bens, Direitos e Valores.




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6. Aspectos legais: penalizações e abrangência

No regramento legal brasileiro são encontradas previsões legais, inclusive para os crimes financeiros. Na Lei 9.613, Art. 1º, encontra-se a previsão de punição, sob a forma de reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa para quem ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal. Tal pena se estende, indistintamente, a quem os converte em ativos lícitos; a quem os adquire, recebe, troca e negocia; assim como a quem importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.

Esse enquadramento legal ainda coloca ao alcance da pena quem utiliza, em sua atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal.

Por sua vez, o uso de informação privilegiada para obter vantagem, para si ou para terceiros também encontra penalização. A Lei 6.385, com redação da Lei 10.303, em seu artigo 27-D, prevê pena de reclusão de 1 a 5 anos, além de multa de até 3 vezes o montante da vantagem ilícita obtida.



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Sujeição à lei de prevenção de crimes financeiros

O Artigo 9º da Lei 9.613 relaciona em 18 Incisos uma série de pessoas cujas atividades encontram-se sujeitas à obrigação de manutenção de cadastros disponíveis para identificação de clientes e transações, bem como à de comunicar a existência de operações cuja natureza e montante estejam relacionadas como de comunicação ao Banco Central.

Essas pessoas (físicas e jurídicas) são aquelas que exercerem, em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessórias, cumulativamente ou não, nos seguintes mercados:

  • Captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros;
  • Compra e venda de moeda estrangeira ou ouro;
  • Operações com valores mobiliários;
  • Bolsas de valores, de mercadorias ou futuros e sistemas de negociação de mercado de balcão organizado;
  • Operações de seguros ou entidades de previdência complementar ou de capitalização;
  • Cartões de crédito e consórcios;
  • Qualquer meio de transferência de fundos, incluindo cartões;
  • Empresas de leasing e de factoring;
  • Distribuidoras de dinheiro ou ativos, inclusive mediante sorteio;
  • Filiais de entes estrangeiros que exerçam atividades em áreas sujeitas às obrigações de cadastro e comunicação obrigatória pela legislação brasileira;
  • Qualquer atividade que dependa de autorização de órgão regulador do mercado financeiro, de câmbio, de capitais e de seguros;
  • Pessoas físicas ou jurídicas que operem no Brasil a interesse de ente estrangeiro que atue em áreas sujeitas às obrigações de cadastro e comunicação obrigatória pela legislação brasileira;
  • Promoção imobiliária ou compra e venda de imóveis;
  • Pessoas físicas ou jurídicas que comercializam jóias, pedras e metais preciosos, objetos de arte e antiguidades;
  • Pessoas físicas e jurídicas que comercializem bens de luxo ou de alto valor, ou qualquer atividade que envolva grande volume de recursos em espécie;
  • Pessoas físicas ou jurídicas que atuem, ainda que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, em operações com imóveis, estabelecimentos comerciais ou industriais ou participações societárias de qualquer natureza, inclusive a atividades esportivas ou artísticas profissionais, exposições, feiras ou eventos similares;
  • Transporte e guarda de valores;
  • Pessoas físicas ou jurídicas que comercializem, ou intermedeiem, bens de alto valor de origem rural ou animal; e
  • Dependências no exterior de entidades brasileiras que atuem em atividades listadas, relativas a residentes no País.


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Resumo

A existência de desvios éticos e práticas criminosas alcançou tal sofisticação e volume que, para seu combate efetivo, necessita-se de uma ação coordenada a nível internacional. A importância desses detalhes, para quem é responsável pelo setor de compliance de uma organização ou mesmo para seus administradores, consiste no fato de que, se não devidamente acompanhados e completamente seguidos princípios éticos e legais, a empresa – e seus agentes – poderão ser condenados legalmente, sendo os responsáveis passíveis de pena de reclusão de três a dez anos de multa.

Um pequeno conflito, contudo, encontra-se estabelecido. Faz parte da postura ética básica do mercado financeiro a manutenção da confidencialidade. Contudo, como tal procedimento veio a se tornar um instrumento utilizado por entidades interessadas pelo mau uso de recursos financeiros, surgiram estudos para definir seus limites e atribuição de responsabilidades aos agentes do mercado.

“Lavagem de dinheiro é o processo pelo qual o criminoso transforma recursos oriundos de atividades ilegais em ativos com origem aparentemente legal”. Existem cinco tipos gerais de lavagem: Ocultação dentro de estruturas empresariais; Utilização indevida de empresas legítimas; Uso de identidades ou documentos falsos e de testas-de-ferro; Exploração de questões jurisdicionais internacionais; e Uso de ativos ao portador.

A lavagem de dinheiro realiza-se por intermédio de um processo dinâmico onde são encontrados: a colocação do dinheiro no sistema econômico, a ocultação da origem do dinheiro e integração dos ativos formalmente ao sistema econômico.



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Da experiência de fiscalização de órgãos internacionais, alguns indicadores de maior possibilidade de operações de lavagem de dinheiro são grandes movimentações de dinheiro em espécie; transferências atípicas ou não justificáveis de recursos de e para jurisdições estrangeiras; transação ou atividade comercial estranha; movimentações grandes e/ou rápidas de recursos; valores incompatíveis com o perfil do cliente; atitude defensiva em relação a perguntas. Outros indicadores são: aumentos substanciais no volume de depósitos em alguma das contas da organização; grandes movimentações financeiras envolvendo operações cambiais; compras de cheques de viagem e administrativos; movimentações financeiras de vulto em cidades de fronteira; movimentação de recursos em montante incompatível com o patrimônio; existência de numerosas contas para um mesmo cliente; existência de contas bancárias localizadas em locais de trânsito, sem justificativas; e utilização de cartões de crédito da empresa em volumes incompatíveis.

“Insider Trader” é o indivíduo que, tendo acesso a informações privilegiadas, as usa em benefício próprio ou para benefício de terceiros. Assim como o “Front Runner” realiza antes para si mesmo a operação ordenada pelo cliente.

Uma das formas mais eficientes de prevenção ao envolvimento com processos criminosos que incorporem a instituição a um processo de lavagem de dinheiro é uma correta gestão da relação empresa/clientes, com atualização de cadastros e informações oportunas às autoridades constituídas.
Resultado do aperfeiçoamento das ferramentas de controle do mercado brasileiro, foi criado o Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Unidade de Inteligência Financeira do Sistema Financeiro Nacional para a prevenção de Lavagem de Dinheiro e crimes conexos.
Entre suas atribuições encontra-se “disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas…”.

O Artigo 9º da Lei 9.613 relaciona em 18 Incisos uma série muito ampla de atividades que se encontram sujeitas à obrigação de manutenção de cadastros disponíveis para identificação de clientes e transações, bem como à de comunicar a existência de operações cuja natureza e montante estejam relacionadas como de comunicação ao Banco Central.



Unidade 2 Módulo 3
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1. O afastamento entre proprietários e empresas

Uma das atividades mais importantes de um setor de compliance de uma grande organização é a de identificar as situações de conflitos de interesses e, de forma ética, gerenciá-los. Uma pergunta que surge, então, é: O que são conflitos de interesses? Por que eles são importantes?

Neste módulo tentaremos compreender o que são esses conflitos e como se deu sua origem, além disso, avaliaremos suas principais consequências para o mundo corporativo, indicando caminhos para sua melhor gestão.

Iniciaremos nosso estudo analisando as relações entre administradores e proprietários.

Alguns autores descrevem o processo histórico de separação entre a propriedade e as empresas, explicando como se deu o afastamento entre a propriedade das empresas e o controle efetivo das mesmas.

De fato, registram esses autores que - à medida que as empresas transformaram-se em grandes corporações, departamentalizadas, altamente estruturadas e especializadas - houve a dispersão do capital, isto é, as empresas passaram a ser propriedade de numerosos acionistas.




ROSSETTI, José P. ANDRADE, Adriana. Governança Corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendências. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2012 p. 67-76.



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Os autores apontam ainda a existência de cinco fatores como determinantes para essa mudança.


A formação de empresas a partir da subscrição pública de ações em forma de sociedades econômicas.

O fato de que algumas empresas já existentes (fechadas) abriram seus capitais, passando todas a serem listadas em bolsas de valores, tendo sua propriedade ali negociada.
Como consequência, houve o aumento do número de investidores no mercado de capitais, que passaram a investir em várias empresas, conduzindo o fracionamento da propriedade das empresas.
Ao decorrer do tempo, a morte de fundadores de empresas iniciou grandes processos sucessórios.
Desenvolveram-se no mercado os processos de fusão de grandes empresas, ampliando também o número de proprietários, a par do aumento do capital.





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Esse conjunto de fatores possibilitou a criação do sistema acionário de propriedade das modernas corporações, ao lado da formação dos grandes conglomerados empresariais e da concentração de capital em empresas, que por fusões sucessivas, tornaram-se verdadeiros gigantes.

Entretanto, outro fenômeno se manifestou: a multiplicação do número de acionistas e a pulverização da propriedade. Ainda mais, a propriedade, que era uma relação mais perene, tornou-se eventual, pela facilidade de negociação de parcelas de propriedade nas bolsas de valores. Essa situação, por fim, chega à despersonalização da propriedade, pois não mais existe uma identidade entre proprietários e empresas, entre acionistas e o dia a dia da empresa.

Na economia norte-americana já se encontrava caracterizada a dispersão do capital no início dos anos 30 do século XX, o que deu oportunidade a profundos estudos. Destacam-se as conclusões de Monks e Minow que comprovaram não apenas a dispersão como também novo relacionamento entre esses acionistas e as empresas, mais distante. Esses acionistas encontram-se não apenas distanciados como ausentes, denominando-os “proprietários passivos”.

Essa nova forma de relacionamento acaba por conduzir a um verdadeiro “divórcio” entre a propriedade e a gestão, como será registrado na próxima seção.




MONKS, Robert A. G. MINOW, Nell. Shareholds: owenship. In Corporate governance.3. ed. Oxford: Blackwell, 2004.



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2. O divórcio entre a propriedade e a gestão

O processo de afastamento entre proprietários e empresa, causados pela dispersão da propriedade e a ausência dos acionistas na gestão da empresa ficaram caracterizados por profundas mudanças, nelas destacando-se:



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Berle e Means apontam três aspectos particularmente importantes na evolução das empresas:

O afastamento entre propriedade e controle envolve a organização de uma nova forma de empresa. A dispersão do controle de capital por intermédio da concentração do mesmo em modernas sociedades anônimas criou empresas extremamente poderosas, cujas atividades rivalizam-se até com a ação do Estado, viabilizando um até então inexistente conflito entre poder econômico e poder político.

Nessas novas empresas uma série de características se estabelece:



BERLE, Adolf A. MEANS, Gardiner C. The modern corporation and private property. 2 ed. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1965.



Proprietários passivos, divorciados do controle da organização, e não-proprietários que efetivamente têm o controle e o poder de decisão, impondo seus valores, sua personalidade à gestão.




Mas depende também do humor do mercado acionário, tendo em contrapartida o proprietário maior liquidez pela possibilidade de negociação de suas ações no mercado.




A riqueza decorrente da propriedade somente pode ser usufruída por meio da venda do ativo ou da distribuição eventual de dividendos.




Os proprietários ficaram com um símbolo de propriedade, um título, uma folha de papel. O poder, o controle e a responsabilidade da gestão foram transferidos para os gestores profissionais.




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A transição do poder, como já descrito, estabeleceu a existência de divergências de interesses entre proprietários e gestores. Tolhidos pela sua impotência diante do controle dos gestores sobre o patrimônio, os proprietários passaram a focar suas ações em três interesses:

Vale destacar, ainda, que a modelagem clássica, refletida em obras tradicionais como A riqueza das Nações, de Adam Smith, propõe a existência da propriedade privada unida à posse, domínio e efetivo controle de ativos reais. A empresa seria uma parcela do patrimônio de uma única pessoa ou um grupo de sócios, reunidos em torno da gestão. O divórcio existente nos grandes conglomerados empresariais não se submete a tal modelo, tornando tal modelagem inadequada à explicação da dinâmica da moderna vida corporativa em vários aspectos.



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3. A Teoria da Agência e seus conflitos

Conforme apresentado por Silva:


Existe um relacionamento de agência quando uma ou mais pessoas concede a outra pessoa – o agente – a atribuição de desempenhar alguma tarefa em seu favor, a incluir a autoridade para o agente dirigir o processo de tomada de decisões.

Esse ajuste teórico encontra-se presente no arranjo institucional das grandes empresas, onde os proprietários do capital acabam por outorgar os poderes de gestão, de condução dos negócios a profissionais para isso contratados, os quais colocam-se em posições de comandamento e controle daquelas organizações.

Em consequência desse arranjo, esses executivos mantêm-se focados em decisões de natureza financeira, de ordenamento administrativo, alocação de recursos, gestão de riscos e nas operações cotidianas, prestando um serviço e obtendo sua remuneração. Aos proprietários resta fornecer o capital e exigirem desses gestores informações acerca da condução dos negócios.



SILVA, Edson Cordeiro. Governança Corporativa nas Empresas: guia prático para acionistas, investidores, conselheiros de administração, executivos, gestores, analistas de mercado e pesquisadores. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 33.



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Este posicionamento da relação proprietários/gestores encontra-se fundamentado na contratação, pelos proprietários, de executivos cujas decisões tragam bons retornos para os acionistas, e de boa remuneração. A esse relacionamento denomina-se “relação de agência”, pois os executivos são os agentes dos proprietários.

Naturalmente, essa contratação encontra-se envolvida em expectativas dos proprietários acerca do desempenho operacional da empresa. Essa relação, contudo, não consegue evitar a ocorrência de conflitos de agência, pois as expectativas das partes não são passíveis de pleno atendimento, uma vez que as expectativas de uma parte nunca serão plenamente atendidas pela outra, e por não ser razoável que os agentes (os executivos) atuem perfeitamente de acordo com o desejo dos proprietários.

Nas palavras de Klein e Jensen-Meckling, não existe contrato perfeito (é impossível antecipar-se em contrato todas as possibilidades de futuros conflitos e regramento das expectativas), assim como não existe o agente perfeito (a atuação dos executivos não ocorrerá de forma similar à dos acionistas).



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Os conflitos de agência, então, são situações em que as expectativas dos dois grupos encontram-se em conflito, as quais normalmente encontram-se distribuídas em:



Uma parte substancial dos conflitos encontra-se estabelecida na remuneração dos gestores, tendo sido observada a existência de valores elevados em salários e benefícios (vantagens indiretas), conflitantes com os valores gerados para os acionistas.




Muitas vezes, como forma de assegurar a boa vontade dos acionistas e a manutenção de seus empregos, executivos concentram-se em obter resultados a curto prazo, sem adequado exame quanto à sustentabilidade desses resultados a longo prazo.




Em escala crescente, pressionados pela necessidade de gerar resultados, e desprezando considerações éticas, vêm sendo registradas fraudes, nas quais resultados são forjados, de forma cada vez mais sofisticada, envolvendo mesmo a colaboração de auditorias independentes.




A dinâmica das operações conduz, ocasionalmente, a adoção e implementação de diretrizes estratégicas por parte dos gestores, sem aprovação por parte dos acionistas, o que abre a possibilidade de decisões a atender mais interesses do corpo diretivo do que aos proprietários.




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4. Os grupos de interesse e o seu equilíbrio

Uma questão fundamental a ser avaliada quando do estudo dos conflitos de interesse dentro das corporações é a identificação das pessoas, grupos ou instituições que possuem interesses legítimos na atuação das empresas (os stakeholders), bem como dos grupos que se formam para defender os interesses que lhes são próprios.

A crescente complexidade das relações entre as empresas e a sociedade na qual se encontram inseridas tem aberto espaço para novas formulações teóricas, sendo possível agrupar esses stakeholders em torno dos seus interesses, conforme mostra o quadro a seguir.




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Todos esses grupos possuem interesses legítimos, os quais se encontram em jogo no seio das grandes corporações. Em considerável parte das vezes seus interesses são conflitantes, o que torna da maior importância sua gestão, e como requisito para os profissionais de compliance a necessidade de serem capazes de reconhecer seus diversos interesses e identificar os diversos conflitos. Reconhecidos e identificados, tornar-se-á possível a tomada de decisões sustentáveis no longo prazo.

Uma diretriz maior no equilíbrio desses interesses é o fato de que as empresas têm como maior função a agregação de valores ao capital inicialmente investido, sem que ocorra o desprezo a valores morais, legais e éticos.

Tal objetivo encontra suporte lógico:

A essas lógicas, de natureza microeconômica, deve ser acrescentada uma de natureza macro, que defende que o bem-estar coletivo é mais facilmente realizado quando cada um persegue seus objetivos particulares.



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Contudo, há de se observar que proposições no campo da responsabilidade social das empresas têm sido contrapostas, particularmente quanto a:




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Resumo

Os conflitos de interesse são uma realidade das empresas modernas. O desenvolvimento das modernas corporações implicou no progressivo afastamento entre a propriedade e a gestão: tradicionalmente o papel de controle, de tomada de decisões era exercido pelos “capitães da indústria”, proprietários que centralizavam em suas pessoas o tríplice papel de proprietários, controladores e decisores. O desenvolvimento das empresas causou a concentração do capital por diversos proprietários, os quais passaram a contratar administradores profissionais, que assumiram o efetivo controle das ações organizacionais e relevante papel no processo de tomada de decisões.

Em consequência, ocorreu o divórcio entre a propriedade e a gestão. Cada vez mais os proprietários foram substituídos pelos grandes executivos como dirigentes das corporações. Essa situação criou o primeiro grande conflito de interesses, contrapondo os gestores aos proprietários. Os proprietários passaram a ser associados a um papel de proprietários passivos, diante do poder crescente dos executivos. Tal situação veio a ser contraposta, mais modernamente, à criação de boas práticas administrativas condensadas sobre os princípios de governança corporativa.

Essa delegação de poderes por parte dos proprietários aos dirigentes é estudada pela teoria da agência, pois os dirigentes atuam como agentes dos proprietários. Essa relação entre agentes e investidores possui conflitos, os quais passaram a ser denominados conflitos de agência. Conflitos de agência ocorrem pela impossibilidade do estabelecimento de um contrato que antecipadamente preveja todas as situações, normatizando-as; bem como não existem agentes ideais, que atuem em perfeita consonância às expectativas dos proprietários.



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A complexidade das relações estabelecidas pelas corporações veio a dar origem ao conceito de stakeholders, que é uma denominação genérica para todos os grupos que coexistem interna, externa e no entorno das organizações mercantis, nelas possuindo interesses. A existência desses stakeholders e seus interesses também criou seus conflitos, os quais necessitam ser corretamente identificados e adequadamente geridos, a fim de se garantir a geração de bons resultados a longo prazo.

O principal fundamento à existência das empresas continua a ser a geração de resultados a serem agregados ao capital inicial investido pelos proprietários. Essa diretriz, mitigada pelas necessidades do respeito a limites morais, legais e éticos, continua a ser fundamental.

Como contraponto a essa diretriz, considerações acerca de responsabilidade social e ambiental, ao lado do reconhecimento da necessidade do equilíbrio entre os interesses dos diversos grupos como premissa à existência, no longo prazo, de resultados sustentavelmente favoráveis permite o estabelecimento de um marco teórico onde atuam os profissionais de compliance.



Unidade 2 Módulo 4
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1. Gestão das demandas dos stakeholders

Como já vimos, existe um conjunto de interesses dentro de uma corporação, que colocam lado a lado (quando não em confronto) um numeroso conjunto de grupos (proprietários, gestores, empregados, fornecedores, clientes, governo, competidores).

A pacificação desses interesses encontrou no passado recente a formulação de grandes marcos regulatórios que balizam o processo de tomada de decisões, dando forma ao que passou a ser denominado Governança Corporativa. Esses marcos, reunidos a princípios éticos e morais, juntamente a determinações legais, estabelecem parâmetros nos quais são determinadas as normas éticas das grandes corporações, as quais vêm progressivamente sendo formalizadas em códigos de conduta ética.

O presente módulo tem, então, o propósito de apresentar esses balizadores, fazendo ainda considerações sobre a formulação de normas éticas. Tais apresentações começarão por breves ideias acerca da gestão das demandas dos stakeholders.

 




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Segundo Rossetti e Andrade, inicialmente, o estudo dos conflitos de interesse concentrou-se nos conflitos de agência, que são aqueles que ocorrem entre os acionistas e os gestores.

Basicamente focado na existência de proprietários passivos, dando possibilidade a ações menos éticas de gestores e, também, de conflitos entre acionistas majoritários e minoritários, onde ocorrem oportunidades para ação de acionistas oportunistas, que agem a favor dos componentes do bloco de controle em detrimento dos demais.

Limitadas as análises a essas questões, as regras ora existentes foram suficientes. Contudo, o alargamento das interfaces entre as empresas e a sociedade ampliaram as análises, de forma a incluir a necessidade de harmonização de novos grupos, assegurando lucratividade, crescimento e fluxos de caixa adequados no longo prazo.

Como resposta a esse problema, os autores resumiram a questão. Na figura que veremos a seguir podem ser observadas questões de fundamental importância na gestão de conflitos de interesse no seio das organizações.



ROSSETTI, José Paschoal. ANDRADE, Adriana. Governança Corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendências. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 131.




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Observe:

Ao se observar (quadrante inferior esquerdo) que as expectativas de retorno dos shareholders não são atendidas, e que não é considerada a necessidade de gestão estratégica dos outros stakeholders, o resultado é catastrófico, pois as práticas e resultados não são sustentáveis. Ainda que ocorra uma política de atendimento das demandas dos proprietários (quadrante superior esquerdo), não ocorre uma solução, pois o estabelecimento dos conflitos com outros interesses acabará por aumentar os riscos, conduzindo a declínio da organização no longo prazo.

Por outro lado, se houver uma gestão estratégica de outros stakeholders, mas não se atendendo as expectativas de retorno dos proprietários (quadrante inferior direito), não há solução de conflitos, pois o não atendimento das expectativas acabará por causar situações que comprometerão a continuidade da organização.


A solução só pode ser encontrada quando, simultaneamente, são atendidas as expectativas de retorno total dos acionistas e realizadas boas práticas de gestão estratégica dos demais grupos. Tal situação ocorre apenas quando há adoção, implementação (prática efetiva) de boas práticas, pois aí efetivamente ocorre pacificação de conflitos e harmonização de interesses.

A solução só pode ser encontrada quando, simultaneamente, são atendidas as expectativas de retorno total dos acionistas e realizadas boas práticas de gestão estratégica dos demais grupos. Tal situação ocorre apenas quando há adoção, implementação (prática efetiva) de boas práticas, pois aí efetivamente ocorre pacificação de conflitos e harmonização de interesses.



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2. Criação de marcos regulatórios às ações das empresas

A criação de marcos regulatórios tem sido consolidada em um conjunto de práticas que tem por finalidade assegurar os melhores resultados ao desempenho da empresa, garantindo o melhor resultado aos investidores. Tal garantia facilita, às empresas, o acesso aos capitais disponíveis no mercado financeiro.

Conforme anotado por Rossetti e Andrade, a temática de desenvolvimento de um marco teórico em torno do qual as empresas podem assegurar a adoção das melhores práticas de gestão ganhou maior destaque nas duas últimas décadas (1990-2010), em movimentos diversos que ocorreram de forma quase simultânea.

Destacam os autores, pela importância e significado histórico, quatro referenciais, quatro marcos históricos:

  • o pioneirismo de Robert Monks,
  • o relatório Cadbury,
  • os princípios da OCDE,
  • e a Lei Sarbanes-Oxley.

Passemos, então, em revista, esses marcos.



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O ativismo pioneiro de Robert Monks

Da sua experiência profissional, Robert Monks absorveu vívido conhecimento acerca das distorções existentes na forma como são conduzidas as grandes companhias. Uma das suas primeiras percepções é o fato de a condução das empresas estar ligada não aos proprietários, mas aos executivos. Registrou, ainda, que por vezes, executivos encontram-se muito interessados em obter vantagens pessoais, mesmo com prejuízos para os resultados da empresa.


Os acionistas, segundo Monks, querem apenas a valorização de suas ações, mas não se esforçam em melhorar a performance das empresas, assumindo uma atitude passiva.




Monks indicou que o combate a tal situação teria o potencial de transformar os resultados, em aspectos muito além dos financeiros, abarcando toda a cadeia produtiva.

Percebeu a importância dos investidores institucionais (fundos de pensão) como proprietários, percepção que desenvolveu quando de uma experiência administrativa no setor público norte-americano. Dessa experiência desenvolveu nova análise do papel desempenhado pelos fundos, ressaltando a importância de fazer do administrador o responsável maior pelo desempenho diante dos votos dos proprietários e diante dos conselhos de administração.

 



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Monks atacou a falta de transparência na gestão das companhias e sugeriu a necessidade de maior intervenção dos órgãos reguladores como fator necessário à melhoria dos padrões de eficiência do mercado de capitais.

Nesse aspecto, em especial, os estudiosos de Monks percebem a sutil tensão existente entre a defesa do intervencionismo aliada à profunda convicção a favor da ação dos mercados.


Esse conjunto de convicções levou Monks a assumir uma postura mais ativa no mercado em defesa dos seus direitos de acionista minoritário em diversas empresas, envidando esforços no sentido de organizar acionistas minoritários em blocos para melhor verem representados seus direitos e defendidos seus pontos de vista.

Fundou em 1992 uma organização que se especializou em adquirir parcelas acionárias de empresas em dificuldades, com vistas a efetuar profundas reformas administrativas, aumentando seu valor.

Tal ação visava não apenas obter lucros, mas principalmente comprovar que seu ativismo não era apenas movido por ideias sociais, mas principalmente que a adoção de sua doutrina geraria resultados efetivos, adicionando valor às empresas e à economia.


Robert Monks proclamou a necessidade primordial do monitoramento das atividades das empresas por parte de seus acionistas, clamando atenção para aquilo que julgava o risco maior dos conflitos de agência: a corrupção. Justificava, de forma vigorosa, a necessidade vital de resgate da ética corporativa.




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O Relatório Cadbury
O segundo marco, embora fortemente influenciado pelas ações de Robert Monks, ocorreu de forma bem diversa. No Reino Unido, até o início dos anos 90 do século passado, os conselhos de administração não atuavam de forma adequada. Diante desse cenário, o Banco da Inglaterra estabeleceu um comitê para estudar a questão e apresentar um código de melhores práticas de governança corporativa, coordenado por Adrian Cadbury e composto por representantes da Bolsa de Valores e de contadores.

Constituído o Comitê, foram propostos alguns termos de referência, focados em duas ideias base: prestação responsável de contas e transparência.

Essas ideias foram distribuídas entre 5 termos:



Adrian Cadbury era um profissional experimentado, já tendo presidido uma grande corporação (Cadbury Schweppes) e atuado como conselheiro do Banco da Inglaterra, sendo uma pessoa dotada de uma visão transformadora de gestão.




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Tendo como ponto de partida os termos citados, as conclusões do comitê foram consolidadas no Relatório Cadbury, sendo submetidas a audiência pública para críticas do povo britânico, recebendo mais de 200 sugestões de melhoria. A reação foi muito diversificada, de posições contrárias quanto a mudanças em práticas tradicionais britânicas ao apoio irrestrito do gabinete então no poder.

A versão final do Relatório foi editada em dezembro de 1992, passando a influenciar fortemente as práticas negociais britânicas, com reflexos na edição de códigos semelhantes posteriormente organizados no Canadá, Estados Unidos, França e Austrália.

O Relatório Cadbury apresenta foco na separação de responsabilidades entre conselho e direção e na constituição do conselho de administração, conforme a seguir descrito:





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Os princípios da OCDE



Estabelecido pela OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o terceiro marco é o primeiro fruto de um órgão multilateral.

Fruto de estudos da Organização, surgiu da constatação de estudos acadêmicos de que há forte correlação entre mercados de capitais confiáveis, o crescimento dos negócios corporativos e o desenvolvimento das nações.



Como organismo multilateral, o objetivo foi o estabelecimento de princípios balizadores mais que determinantes. Concluídos seus trabalhos, a OCDE emitiu em maio de 1999 um conjunto de princípios que podem ser assim resumidos:

 

  • não há um modelo único de governança;
  • as corporações precisam inovar suas práticas, de forma a atender às novas exigências do mercado;
  • os governos têm grande responsabilidade no papel de regulador dos mercados;
  • os órgãos reguladores, juntamente às corporações e seus acionistas é que devem estabelecer as melhores práticas em cada país;
  • as boas práticas asseguram integridade ao mercado e desempenho econômico;
  • as boas práticas devem ser de natureza evolutiva.

 



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Essas conclusões, tornadas referências no mercado internacional, dentro do espírito de permanente atualização, foram revistas.

Uma nova versão dos princípios da OCDE – a serem adaptados para cada um dos países - foi apresentada em 2004, cujos princípios podem assim ser sintetizados:



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A Lei Sarbanes-Oxley

A Lei Sarbanes-Oxley (SOX) foi, como já registrado em nosso curso, uma reação à recorrência de fraudes no mercado norte-americano e promove ampla regulação da vida corporativa, fundada em boas práticas de governança e direcionada por quatro valores fundamentais:




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3. Os 8 Ps da governança corporativa

Rotineiramente, as diversas formulações de princípios de boas práticas passaram a ser apresentadas sob a forma dos 8 Ps, representando:

Essa evolução doutrinária teve reflexos no ambiente do mercado brasileiro, como veremos adiante.

 



Saiba + Propriedade

O desenvolvimento de boas práticas, naturalmente, manteve o foco na análise desse item. Assim, uma das dimensões da governança corporativa é a identificação de possíveis focos de conflitos, removendo-os, de forma a evitá-los e diminuir custos de agenciamento. Outra questão neste quesito é o objetivo de assegurar a coesão societária, transparência dos atos dos sócios que exerçam cargos diretivos, o monitoramento de conselhos e outros órgãos corporativos.




Saiba +Princípios

Diferenças culturais são obviamente previsíveis e aceitáveis, contudo há princípios éticos inegociáveis, valores como justiça, transparência, contabilização e cumprimento das regras devem ser sistematicamente definidos e praticados.




Saiba +Propósitos
Esse propósito deve ser harmonizado com interesses, também claros e legítimos, das demais partes interessadas. É do interesse de todos, inclusive os proprietários, que as demandas de todos os grupos de interesse sejam estrategicamente geridas, de forma a assegurar resultados sustentáveis de longo prazo. Essa harmonização deve ser efetuada sob as interferências de um tríplice objetivo de resultados financeiros, sociais e ambientais. A questão limite é a forma como deve ser obtido esse equilíbrio e harmonização.




Saiba +Papéis
Aos proprietários cabe definir a estrutura da companhia e a indicação dos administradores. Aos conselheiros cabe a proteção e valorização do patrimônio da empresa. Aos gestores a efetiva gestão dos negócios. A acumulação desses papeis é claramente inadequada.




Saiba +Poder
Cabe apenas aos proprietários definirem essa estrutura, pois o poder assumido pelos gestores, na ausência de presença ativa dos proprietários, é fonte de conflitos. Estruturas de poder claramente estabelecidas pelos proprietários conduzem a maior clareza na separação de funções e de esferas de responsabilidade. Decisões corporativas de alto impacto devem ser necessariamente compartilhadas.




Saiba +Práticas
As relações funcionais praticadas entre esses entes, nos processos de formulação, homologação, monitoramento da ação organizacional, paralelamente aos sistemas de controles internos são fundamentais à obtenção de bons resultados e à sobrevivência da empresa.




Saiba +Pessoas

A existência de relações interpessoais íntegras, baseadas em regras morais e harmoniosas, mitiga os riscos. Em síntese, a adoção de um conjunto de boas práticas tem sua base na definição e construção de boas relações entre as pessoas que trabalham no seio de uma empresa.




Saiba +Perpetuidade

À medida que as práticas adotadas pela empresa conduzem à geração de bons resultados, sustentáveis no longo prazo, um de seus resultados é a sobrevivência da empresa.




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4. Marcos regulatórios no Brasil

Como marcos regulatórios no ambiente brasileiro, os autores citados indicam a existência de quatro fortes marcos, forças de controle importantes para a compreensão do ambiente de negócios e a cultura de boas práticas existentes:

• os marcos legais e as recomendações da Comissão de Valores Mobiliários (CVM);
• as determinações da Bolsa de Valores de São Paulo;
• pressões institucionais de grandes investidores (fundos de pensão);
• o código das melhores práticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Para os fins deste curso de ética e compliance, o mais importante marco é o Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. Esse Código encontra fundamento na existência de 4 princípios básicos aos quais é associada uma série de objetivos:


• Transparência,
• Equidade,
• Prestação de Contas (accountability) e
• Responsabilidade Corporativa.


Confira as atualizações da 4ª edição do Código das Melhores Práticas de Governança

VÍDEO



Você pode baixar para o seu computador uma cópia da última edição do código, que está disponível em http://www.ibgc.org.br/CodigoMelhoresPraticas.aspx




Tela 69
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A adoção de uma cultura de transparência associa-se a três objetivos. Às empresas cabe cada vez mais não apenas informar o mercado por ser uma obrigação, mas devem ter o objetivo de cultivar entre os seus recursos humanos, desde os níveis da alta gerência até o pessoal do “chão de fábrica”, uma cultura que valorize essa atribuição, em conformidade com um “desejo de informar”. Um segundo objetivo a ser alcançado com a cultura de transparência é um clima de confiança, não apenas entre o público interno mas também junto às partes interessadas externas à companhia. Finalmente, a transparência deve ser aplicada não apenas acerca do desempenho econômico e financeiro, mas a todos que cercam a cadeia de geração de valor.

O princípio da equidade, voltado para a adoção de princípios de gestão norteados pela justiça, encontra-se distribuído entre dois objetivos. O primeiro, de tratamento justo e igualitário para todos os grupos minoritários, seja entre os proprietários, seja a outros grupos de interesse. Um segundo objetivo encontra-se vinculado a assegurar que, no conjunto da cultura organizacional, não são encontradas atitudes, ou políticas, que possam vir a se caracterizar como discriminatórias (preconceitos vinculados a sexo, opção sexual, religião, raça ou manifestações culturais).




Tela 70
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As prestações de contas são encontradas em um princípio denominado, em inglês, de accountability, também distribuído entre dois objetivos. Esse princípio busca assegurar que os agentes (gestores) prestem conta aos proprietários, devendo responder inteiramente pelos atos por eles praticados na gestão do patrimônio da corporação.

A responsabilidade corporativa envolve objetivos nos campos da sustentabilidade dos resultados, sob os aspectos econômico-financeiros, sociais e ambientais. A perenidade da empresa é um grande objetivo, a ser alcançado por uma visão de longo prazo que inclua a sustentabilidade. As empresas devem assumir uma atitude que inclua, entre suas preocupações, as questões sociais e ambientais. Particularmente quanto às questões sociais, deve ser considerada a função social de criação de empregos, de criação de riqueza, da qualificação e diversidade dos recursos humanos, o desenvolvimento científico e tecnológico, bem como uma cultura voltada para a melhoria da qualidade de vida de seus colaboradores e da contratação de recursos humanos preferencialmente na própria comunidade em que a empresa atua.




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5. Ética nos negócios

Ética profissional se refere a todas as profissões, encontrando-se focada nos aspectos normativos e jurídicos do exercício de uma atividade profissional.


Dessa forma, a ética profissional deve ser compreendida como a aplicação, a prática de um conjunto de normas de conduta que regulam o desempenho de profissões ou atuação de empresas.

Assim observada, a ética torna-se indispensável à correta conduta profissional. Responsabilidades éticas, responsabilidades no atendimento e respeito a regras de conduta pré-estabelecidas, devem ser encaradas como atitudes, comportamentos, ações que atendam às melhores expectativas legítimas de todos os stakeholders com os quais a empresa se relaciona.

As fortes transformações a que o mundo dos negócios foi submetido na história recente exigiram a formatação de novos parâmetros de comportamento e regramento. A emissão de diversos códigos de conduta descritos no presente módulo é uma resposta às necessidades geradas por esse “novo mundo corporativo”.


Em linhas gerais, o comportamento ético, no mundo corporativo, inclui respeito a todos os grupos de interesse, respeito aos direitos dos proprietários (indistintamente se majoritários ou minoritários), a transparência na divulgação de informações, a prestação de contas à comunidade, o respeito ao meio ambiente e à responsabilidade social atribuída às empresas.




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Dentro desse conceito, o profissional de compliance deve se dedicar no sentido de disseminar uma cultura de altos padrões éticos e morais, pois à empresa é necessário uma boa imagem, e tal só poderá ser alcançado com adoção de princípios rigorosos, que respeitem a diversidade cultural da sociedade em que se encontre inserida a empresa.

Outra preocupação deste profissional deve ser incentivar a elaboração e adoção de um código de ética customizado às necessidades da empresa em que atua. Este código é a ferramenta adequada para a empresa estabelecer e divulgar seus valores e indicar para seus colaboradores o padrão de comportamento que deles se espera.

Mais ainda, por intermédio de um código de ética, a empresa dá a conhecer a todas as partes interessadas – incluindo seus colaboradores – suas normas, valores e comportamentos, permitindo a todos perceber quais são as decisões esperadas para determinadas situações.


Trata-se, portanto, não apenas de explicitar um padrão de comportamento esperado, mas também permitir que seja identificada, em sua imagem pública, a consistência de suas práticas frente a um conjunto de crenças morais e jurídicas.



Tela 73
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O código de ética de uma empresa, conforme Candeloro, deve ser o fruto de uma reflexão sobre os seguinte propósitos:

• a definição de comportamentos aceitáveis;
• a promoção de altos padrões de comportamento;
• o benchmark dos participantes do mercado e
• diretrizes de comportamento e responsabilidade profissional.



Esse documento deve ser redigido em linguagem direta, objetiva, em termos de fácil compreensão, tudo de forma a não permitir que permaneçam dúvidas ao leitor quanto às práticas esperadas, sobre os princípios defendidos.

O código deve contemplar todas as situações possíveis, devendo o profissional de compliance permanecer atento ao surgimento de situações em que uma solução demonstrar-se inadequada, ou uma nova situação vir a surgir, de forma a promover atualizações ou alterações.

 



CANDELORO, Ana Paula P. DE RIZZO, Maria B. Martins. PINHO, Vinícius. Compliance 360º: riscos, estratégias, conflitos e vaidades no mundo corporativo. São Paulo: Trevisan, 2012. p. 80.




Tela 74
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Dessa forma, um código de ética deve considerar as políticas adotadas pela empresa, assim como as especificidades culturais da sociedade em que se encontra inserida a corporação. Contudo, a despeito de qualquer diversidade existente, alguns princípios basilares devem ser incluídos em qualquer código de ética, quais sejam:

• não atuar deslealmente para com a concorrência;
• não atuar de forma a manipular as condições de mercado;
• funcionários, de qualquer escalão, não devem utilizar recursos da empresa em benefício próprio ou de terceiros;
• a prática de recebimento de presentes, empréstimos ou quaisquer favores de grupos de interesse deve ser coibida;
• informações confidenciais não podem ser utilizadas por qualquer funcionário com vistas a benefício próprio ou de terceiros;
• os controles internos devem assegurar que as operações ocorrem conforme o planejado, respeitando as normas e procedimentos previstos;
• todos os recursos humanos, de todos os níveis, são igualmente responsáveis pelo respeito aos princípios adotados pela empresa;
• qualquer desvio de conduta deve ser encarado de forma firme e clara em defesa dos valores da organização;
• o sigilo sobre operações realizadas e cadastro dos clientes deve ser preservado;
• os interesses dos clientes devem ser respeitados no limite da lei;
• os funcionários devem adotar altos níveis éticos e morais em sua conduta profissional;
• atividades político-partidárias, religiosas ou filantrópicas devem ser adequadamente tratadas;
• a urbanidade no tratamento aos clientes deve ser uma constante; e
• possíveis contribuições a campanhas políticas devem ser efetuadas de forma transparente e orientadas pelos interesses de longo prazo da empresa.

Finalmente, deve ser realçado que o código deve ser adotado por todos os colaboradores, a partir do mais alto nível de gerenciamento pois, como registrado por Candeloro, a ENRON dispunha de um código de ética de 65 páginas.



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Resumo

Inicialmente, o estudo dos conflitos de interesse concentrou-se nos conflitos de agência, com a ampliação das interfaces entre as empresas e a sociedade ampliaram-se as análises, de forma a incluir a necessidade de harmonização de novos grupos, assegurando lucratividade, crescimento e fluxos de caixa adequados no longo prazo.

O desenvolvimento de um marco teórico pode ser descrito em torno de quatro marcos históricos: o pioneirismo de Robert Monks, o relatório Cadbury, os princípios da OCDE e a Lei Sarbanes-Oxley.

Rotineiramente, as diversas formulações de princípios de boas práticas passaram a ser apresentadas sob a forma dos 8 P´s, representando: Propriedade, Princípios, Propósitos, Papéis, Poder, Práticas, Pessoas e Perpetuidade. No ambiente brasileiro existem quatro forças de controle do ambiente de negócios e da cultura de boas práticas existentes: os marcos legais e as recomendações da Comissão de Valores Mobiliários (CVM); as determinações da Bolsa de Valores de São Paulo; pressões institucionais de grandes investidores (fundos de pensão); e o código das melhores práticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Para os fins deste curso de ética e compliance, o mais importante marco é o Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. Esse Código encontra fundamento na existência de 5 princípios básicos aos quais é associada uma série de objetivos: Transparência, Equidade, Prestação de Contas (accountability) e Responsabilidade Corporativa.

Em linhas gerais, o comportamento ético, no mundo corporativo, inclui respeito a todos os grupos de interesse, respeito aos direitos dos proprietários (indistintamente se majoritários ou minoritários), a transparência na divulgação de informações, a prestação de contas à comunidade, o respeito ao meio ambiente e à responsabilidade social atribuída às empresas.